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Poeta e apenas poeta
Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" ...
sexta-feira, 23 de setembro de 2011
Copo Sujo
Lucas C. Lisboa
Numa briga de casal
chega dois policial
ou vira logo bangbang
ou senão um gangbang
a briga tem razão tal:
ela não quer fazer anal
é pinga cachaça e sangue
bueiro fedor de mangue
Bebo na mesa ao lado
e dou um trago no cigarro
ouvindo a voz arranhada
da moça c'o namorado
que sequer noto o catarro
do mendigo na calçada
quarta-feira, 21 de setembro de 2011
Outono
Eu penso que as folhas secas
são rascunhos de poemas
descartados pelas árvores
e inspiradas pelo sol
terça-feira, 20 de setembro de 2011
Flerte sobre trilhos
Lucas C. Lisboa
Com o doce balanço do vagão
Ela morde seus lábios bem no canto
e conforme lhe sobe seu tesão
relê o poema cheio de tanto encanto
Ele se fez poeta em procissão
que evangeliza como fosse santo
e tem a poesia e a desrazão
as duas únicas deusas de seu canto
ela moça de saia justa e curta
que curte os versos dele com corpo
tendo sua alma cativa e bem absorta
sua silueta no reflexo torto
da janela ele admira e arquiteta
para dela fazer seu cais e porto
quinta-feira, 15 de setembro de 2011
Para dizer a verdade
Lucas C. Lisboa
Carlos plantava sapatos
para colher suas abóboras
e fazer porta-retratos
duma mesa cheia de sobras
na ceia de fotos e fatos
as damas e peões de obras
cantam os seus velhos fados
ao preá jogado às cobras
Mas Carlos é dro mundo
e hoje planta tenis nike
feitos por crianças chinas
Não sou ele então abundo
nas praias como beatnik
vendo as bundas femininas
quarta-feira, 14 de setembro de 2011
Carola
Lucas C. Lisboa
a moça de pele negra
mas olhos de céu nascer
seu sonho sujo renega
pro meu deleite e prazer
diz seu "não" a cada entrega
como quem sim quer dizer
ao falo e falar se apega
com vontade de morrer
desminto o que pastor prega
contra a fome de viver
servindo vinho na bodega
bem antes do entardecer
mas a culpa que lhe cega
é da pureza perder
terça-feira, 13 de setembro de 2011
Eu
Lucas C. Lisboa
Meu nome é Lucas Lisboa
sou um poeta bem atoa
dizem que vim do parnaso
mas isso não vem ao caso
Minha poesia destoa
mesmo se meu metro soa
como um antiquado atraso
do trem moderno do acaso
Eu detesto Drummond
não gosto desse seu tom
maestral e filosófico
rigido como um estóico
Que dá conselhos com praso
de validade vencido
se dizendo metamórfico
moderno no cenozóico
Confesso que eu quero mesmo
assustar senhoras gordas
como me ensinou o Quintana
com e após seus cem sonetos
Quero o poema piada
contar história rasteira
Eu quero pegar a estrada
em plena segunda feira
Quero versejar bem livre
da jaula do verso livre
Eu sou toureiro e peão
laço versos co'a escansão
Quero brincar co'a estrutura
do verso mas sem postura
de conselheiro ou de vilão
mas amante por tesão
Meu nome é Lucas Lisboa
sou um poeta bem atoa
dizem que vim do parnaso
mas isso não vem ao caso
Minha poesia destoa
mesmo se meu metro soa
como um antiquado atraso
do trem moderno do acaso
Eu detesto Drummond
não gosto desse seu tom
maestral e filosófico
rigido como um estóico
Que dá conselhos com praso
de validade vencido
se dizendo metamórfico
moderno no cenozóico
Confesso que eu quero mesmo
assustar senhoras gordas
como me ensinou o Quintana
com e após seus cem sonetos
Quero o poema piada
contar história rasteira
Eu quero pegar a estrada
em plena segunda feira
Quero versejar bem livre
da jaula do verso livre
Eu sou toureiro e peão
laço versos co'a escansão
Quero brincar co'a estrutura
do verso mas sem postura
de conselheiro ou de vilão
mas amante por tesão
segunda-feira, 5 de setembro de 2011
A praia vermelha
Lucas C. Lisboa
A garrafa de vidro na parede
se espatifa já seca, vil, vazia,
incapaz de matar a minha sede
em mil cacos da mia melancolia
O desengarrafado cão me pede
um gole de poesia mais vadia
meu verso descuidado logo perde
sua postura na pinga que me ardia
O peito e também nos tantos cortes
em minhas mãos rosadas de meu sangue
pras bitucas meu maço virou tumba
Me sorriem as lixeiras e seus postes
com um cheiro de maresia e mangue
e lhes brindo o champanhe de macumba
A garrafa de vidro na parede
se espatifa já seca, vil, vazia,
incapaz de matar a minha sede
em mil cacos da mia melancolia
O desengarrafado cão me pede
um gole de poesia mais vadia
meu verso descuidado logo perde
sua postura na pinga que me ardia
O peito e também nos tantos cortes
em minhas mãos rosadas de meu sangue
pras bitucas meu maço virou tumba
Me sorriem as lixeiras e seus postes
com um cheiro de maresia e mangue
e lhes brindo o champanhe de macumba
Soneto em homenagem ao meu querido Augusto dos Anjos escrevo à sua maneira e temática um poema em decassílabos heróicos. Ele foi o primeiro poeta que me seduziu , que me fez ver a beleza da forma, sua temática já foi bem comum em minhas obras, hoje volta como um exercício de estilo. De um fazer poético onde todos os temas são lícitos e belos. Sou hoje um oficineiro que não rejeita nenhum material para seu esmeril poético.
sexta-feira, 2 de setembro de 2011
Quotidiano sobre trilhos
Praticamente todo dia quando saio da UFRJ eu pego o ônibus de integração para a estação de Del Castillo. Nessa quinta feira ainda não é dia de pagamento então está todo mundo meio duro. Sinal que recebo mais moedas do que notas. O que me leva a uma situação chata, pois como não sou lá um grande economista, costumo sempre depositar as notas e usar as moedas para minhas despesas do dia a dia, cerveja, comida, ônbus e por ai vai.
Fim de mês, mochila cheia de moedas e eu mudo de vagão para continuar despertando os leitores do seu sono literário. Sim, é assim que eu enxergo o que faço, sou despertador ambulante, um guerrilheiro da poesia. Assalto poeticamente as vítimas em seu momento mais vulnerável: quando estão completamente entediadas, naquela espera até a estação de desembarque. Afinal são muitos os que ficam olhando pro tempo, que jogam um joguinho estúpido no celular, fazem as unhas ou qualquer outra coisa sintomática do tédio absoluto.
Enquanto são absorvidas por um tédio (que só não é maior que ver faustão no domingo na casa da avó) eu levo meu livreto de poemas até elas, algumas se atiçam pela curiosidade quando falo que estou vendendo aquele pedaço de papel, outras abrem o livreto no meio (sim a maioria abre exatamente no meio do livreto) e encontram um poema erótico-engraçadinho, tem também aquelas que quando eu falo a palavra mágica: "poesia" se eriçam na hora. O negócio é que em dois ou três minutos eu coloco um vagão inteiro para ler poesia.
Sim, umas trinta a quarenta pessoas com livreto na mão e lendo poesia. Umas param na primeira e voltam pro universo do tédio, outras já querem comprar! São aquelas que realmente acreditam na poesia e no poder encantatório das palavras. Tem quem leia até o final devorando absortas e nem percebem quando passo recolhendo os livretos, essas se não prestarem atenção que eu estou recolhendo me deixam com o ego tão envaidecido que acabam ganhando o livreto, pois começo achar que seria um crime estragar aquela leitura tão ávida. Tem quem devolva o livreto sem nem abrir e também quem me deseje sorte para lançar meu livro, mal sabendo que com os livretos eu chego a um público que eu nunca conseguiria chegar com o livro, mas eu sorrio e agradeço aos votos.
Mas meu dia é ganho mesmo quando acontecem aqueles eventos únicos como a senhora negra de cabelos brancos que se levanta e começa a recitar um poema meu para suas companhias, sim e é aquele poema erótico-engracadinho! Ela recita em plenos pulmões e fica me elogiando à beça. Eu, claro, fico vermelho de vergonha mas se colocarem uma agulha perto do meu ego ele explode de tão inflado! A senhora então desmancha elogios, diz de como é bom que alguém faça isso no metrô, que leve poesia e arte para as pessoas. A cada elogio ela me encabula mais e mais. Nesse momento eu dou corda, conto para ela do meu sonho que é ter mais e mais gente lendo poesia. Nesse vagão praticamente ninguém me devolve os livretos e melhor, são poucas as moedas e muitas as notas.
Tem quem diga que eu deveria fazer isso na lapa, na frente do CCBB, da biblioteca nacional e outros grandes lugares onde a turma cultural está reunida. Eu conto o caso que aconteceu comigo no trem, bom, no trem se compra e vende de tudo e lá eu aprendi que todo mundo pode se abrir a uma experiência nova se lhe for oferecida. Quando vendo poesia eu nunca seleciono público, seleciono quem vai ler e quem não vai. Nisso os ambulantes que estão ali também recebem livretos, e leem e se divertem com meu trabalho. Mas o melhor dia foi quando eu escutei: "Ei, Lucas, tem poesia nova ai?" e quem me perguntou isso foi o vendedor de coca, cerveja e água. Sim, de bermuda e havaianas e camisa do flamengo ele me veio pedir por mais poesia! O esteriótipo perfeito que muitos dos cultos diriam que jamais iriam gostar de poesia. Mas estava ali me perguntando se eu tinha mais. Ao entregar o livreto ele me fez a pergunta de sempre: "quanto custa?" e eu como sempre com um sorriso desafiador respondi: "Você é quem me diz quanto vale" a resposta me surpreendeu: "pode ser uma coca?". Confesso que eu nunca bebi uma coca cola com tanto prazer.
Tem mais outros tantos casos, estórias engraçadas e divertidas mas agora vou voltar pra minha quinta feira e contar uma das travessuras que aprontei no metrô. Sim, eu acabo vendendo muito no metrô mas ali a venda de poesia não é uma atividade muito bem quista pelos seguranças. Quando entro em um vagão tenho que tomar cuidado para ver se não tem um segurança a bordo, eles sempre me chateiam. Era o segundo vagão da noite, entrei e caminhei até o fundo dele quando reparei quase imperceptível um segurança, ele me notou. Esperei sentado no percurso até a próxima estação e quando fui trocar para o vagão de trás o nosso amigo veio me seguir. Aquela situação estava chata e eu tive que pensar rápido. Quando o apito do metrô soou para as portas se fecharem eu saltei do vagão. E a porta se fechou atrás de mim sem que desse tempo dele continuar atrás. A verdade é que me senti meio que num filme de ação e tive que resisitir a virar e dar tchauzinho para o homem de preto. Sentei na estação, tirei os óculos, vesti o agasalho longe das cameras de segurança e fiquei jogando no celular até o próximo metrô passar.
Ser poeta sobre trilhos, talvez o único poeta underground (literal) do rio, é um enorme prazer. Ver o sorriso no rosto alheio, os olhares encantados, a felicidade estampada vale os riscos. Ninguém pode me tirar esse prazer, principalmente quando sei que são milhões de leitores adormecidos que passam por ali todo dia, aos poucos eu vou conseguindo levar até eles. Oito mil livretos vendidos nesse processo que já dura seis meses. Mas a pergunta que me move é: você tem ideia do que pode uma mente que voltou a usar a sua imaginação?
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