A história que conto agora
já até se foi sem ter sido
era segredo muito embora
por todos fosse sabido
menos pois pros dois viventes
que mais que muito se amavam
Ela santa, ele vilão
tanta fome revelada
Barroca igreja, emoção
uma aventura ensaiada
e no carro o vidro enturva
pelos dois em pura bala
Era assim antes de outrora
o seu fogo ensandecido
que a boca sedenta chora
por onde é bem sabido
eis tão amados amantes
que na prosa planejavam:
"Belo Horizonte é visão
mas não terra destinada
das Minas Gerais sairão
pela noite na calada
numa lua que murmura
pra estrela vestindo gala"
Sem feito o plano embolora
mas do seu jeito sabido
ela é musa que colabora
c'o jeito desatinado
dele de amar tal ardente
fome que jamais amansam
Road trip por todo sertão
uma viagem ousada
trinta horas na direção
ao lado da moça amada
os sonhos no porta-luvas
pois a estrada bem embala
E trocando a marcha rola
um carinho dele atrevido
ela compraz e lhe consola
os dedos num divertido
de dois corpos e uma mente
que do mesmo sopro aspiram
Cecília, seu coração
é guia e norteia em cada
quilômetro do estradão
mas a sua ritimada
vem do gole de fanta uva
que a doçura lhes iguala
São vintage, na vitrola
do carro vem o alarido
de Caetano e cantarola
ela com mais um pedido
que gata pede somente
um Raul que jamais olvidam
Nas letras duma canção
pelas rodas pela estrada
embalando na paixão
ao lado da moça amada
os dois nas retas, nas curvas,
desejos no porta-malas
A vontade descontrola
encosta o carro perdido
E os lábios dela devora
pelo convite atrevido
dela de assim sutilmente
revelar o que ambos clamam
No cerrado, imensidão
tudo pois pruma picada
de aventura e de ilusão
que esperam lá na chegada
serão eles sol e chuva
duma voz que nunca cala
Vida dentro mundo fora
o carro desapressado
sem ter pra chegar sua hora
no tempo do delicado
deleite que tal corrente
seus sutis elos se selam
Cada serra e serração
e cada casa caiada
testemunham nesse chão
os amantes da cilada
embebidos na araruva
e segredos de cabala
Entre um causo e uma história
o sol desce avermelhado
a paisagem rememora
o mundo dos exilados
seu contento descontente
é aquilo que mais esperam
Querem canjica e quentão
festa junina ensaiada
nas terras desse sertão
numa noite aluminada
pela fé na ciência pura
e na utopia que espalha
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