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quinta-feira, 31 de outubro de 2024

riacho

satisfeita a velha

lava o lençol da donzela

sangue e primavera 

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Veneno antigo

Esse frasco de cicuta

são as promessas que fiz

pra mim mesmo sem saber

que matariam devagar 

meu eu, meu sonho e sentido

pouco bem pouco por vez


Não sei se sei dizer quantas 

promessas ainda carrego

por zelo como amuletos.

   Quebro com carinho,

   dos cacos faço um mosaico 

   pra luz entrar sem perigo 


Não sei dizer porquê ainda honro

e prossigo na vingança

silenciosa contra meu passado

   Quebro, enfim, a caixa preta

   e hasteio bandeira branca

   pra mim pois não há inimigos


Eu sei bem daquelas tantas,

que jurei só com meu pranto,

por dores hoje esquecidas

   Quebro em silêncio e grito 

   o que me prende ou afasta 

   do meu sonho e meu sentido


Dos crimes sem ser culpado 

carrego essas juras cúmplice

e penitente as mantenho

   Quebro essas minhas correntes

   Com o formão e o martelo

   pra esculpir a liberdade 

terça-feira, 22 de outubro de 2024

Sinto

o gosto o cheiro das uvas
o tonteio e o embaraço 
Ah! como lhe quero rubra
e nua dentre meus braços

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Prelúdio

Remido fasol mido
Remido sol famido 
Resolmi do lafami
do lafami resolmi

Si solre do famisol
Si solre do mifasol
Remido fa ladomi
Refado mi soldomi

A pianista dizia
no mifasol domi todo
amor ladomi que sentia 

e o poeta remido 
Solfejava em redondilha 
de do re mi até do

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

Poeta Sobre Trilhos

sim senhor doutor 
minha terapia
é ir pro metrô 
vender poesia

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Haicai Xadrez Zoológico

ocaso ecocida

morrem os grandes felinos

de gripe aviária

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

História dos livretos Poeta Sobre Trilhos

São 31 edições, trinta e um livretos do Poeta Sobre Trilhos. São livretos que produzo desde 2011 e levo nos vagões de trens e metrôs do Brasil. Comecei, é verdade, no Rio de Janeiro, saindo de Caxias até Bonsucesso, onde pegava o expresso para a Ilha do Fundão, mas já fiz incursões no metrô paulistano, saindo da estação Tietê até baldear na estação da Luz e ir para São Cristóvão. Hoje, de volta aos meus belos horizontes, vou da Vilarinho até o Eldorado.

São muitos os caminhos que já percorri sobre trilhos, levando poesia, levando meus versos para tanta gente que não sabia que gostava do prazer que um poema pode nos dar. Minhas primeiras edições se chamavam "Sr. Personna, o que trazes pra mim?" Eu imprimia, xerocava, dobrava e grampeava um por um, fazendo em levas de 20, depois 50, depois 100, depois 200, até que comecei a mandar para a gráfica fazer seus 1.000, depois 2.000, ainda em preto e branco e papel sulfite.

Mas dei um salto quando consegui um lugar para fazer mais barato, colorido e com tiragem de 2.500 exemplares na edição 13, que então em seguida foi rebatizado de Poeta Sobre Trilhos, já no ano de 2012. Com esse novo formato, fiquei por muitas e muitas edições coloridas, em papel couchê e produção industrial. Até a edição 28, em 2016, quando caí em depressão e diminui meu ritmo, fazendo a edição 29 em 2017 e a edição 30 em 2019.

Veio então a pandemia, e com ela deixei definitivamente o Rio de Janeiro. Voltei aos belos horizontes em 2020 e toquei meus dias longe dos trilhos por quatro anos.

Em 2024, sentia um vazio no peito, sentia falta de algo, e esse algo não era só escrever, pois continuei nesses anos todos alimentando meu blog srpersonna.com.br com poemas, crônicas, contos e ensaios. Esse algo era o prazer de ver o leitor me lendo à minha frente, mostrando seu poema favorito para outro leitor ao seu lado, declamando meus versos para a namorada e até se emocionando com o que lia.

Fiz então a edição número 31, que, 13 anos após a primeira, me deu um sopro de vida e propósito, me encheu o depósito de lirismo e esperança que andava tão vazio em mim. Ter de volta esse contato íntimo com o leitor me fez mais vivo, me inspirou e conseguiu me tirar de um luto que parecia não ter fim.

Sinto que o bem que eu faço para os leitores não é maior do que o bem que eles fazem por mim. O importante não é o dinheiro, é essa troca íntima e confidente que poucos artistas têm acesso, entre o público real e o poeta. Só quero agradecer por estar de volta como Poeta Sobre Trilhos; esse é meu lugar, de onde eu nunca deveria ter saído.

domingo, 6 de outubro de 2024

Haiquase carente

Sem seu cabelo

amadrugada é longa

como travesseiro

quarta-feira, 2 de outubro de 2024

segunda sem motivo


SEGUNDA SEM MOTIVO
ME MOVO MEIO MANCO
E TRISTE TOMO CAFÉ
SEM AÇÚCAR SEM SAL
O PÃO ME ACOMPANHA
MURCHO SEM RECHEIO
E NO MEIO ME FALTA
UM POUCO BEM POUCO
DE TUDO QUE ME RIO
DOU ADEUS PRA CAMA
LONGUÍSSIMA SEMANA
NUMA MESMA CAPITAL
DONDE NASCI E IREI
MORRER DIA DE CADA
VEZ QUE PASSO NUMA
PRESSA SEM PROSEAR
SEM NEM SEQUER VER
QUE RAIA NOSSO SOL
ENTRE FUMAÇA PRETA
E TRÂNSITO CAÓTICO
TRABALHO E ESPALHO
MEU RESTO DE FORÇA
QUE ME RENEGA ESSA
SEGUNDA SEM MOTIVO