Publicação em destaque
Poeta e apenas poeta
Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" ...
terça-feira, 16 de abril de 2013
de pulso
Inventamos o relógio
numa genialidade louca
para nos esquecer
de nossa estupidez
de nossa insensatez
de nossa pequenez
Olhamos pro relógio
pra não cairmos
no doce conforto
de criarmos deuses
de criarmos mitos
de criarmos sonhos
Pois ao olhar pro céu
em busca do tempo
nós nos damos conta
de quanto é infinito
de quanto é eterno
de quanto é absurdo
na parede como altar
o relógio dita a casa
como no pulso o homem
os precisos relógios
são nossas correntes
modernas e perfeitas
Que nos fizeram enfim
libertos dos deuses
mas escravos da máquina
domingo, 14 de abril de 2013
Os críticos literários de ocasião
sexta-feira, 12 de abril de 2013
Queijos
I - Entrada
Queijo combina com vinho
tal o beijo com carinho
mas se combinar demais
vira suspiros e ais
II - Convite
Quero um jantar bem gostoso
pão molhado no foundue
coberto de queijo cremoso
com velas ali e aqui
III -Dizem
que quanto mais fedorento
mais refinado é o queijo
mas é teu perfume suave
que saliva meu desejo
sábado, 6 de abril de 2013
Pechincha de feira
Se pela boca desdenha
mas o corpo quer comprar...
Como apagar essa lenha
com tanto fogo a queimar?
Só há um jeito meu bem: venha
cá comigo se deitar
sem perigo sabe a senha:
fruta doce do pomar
por estas maçãs tenha
fé que vai se aconchegar
entre bananas da Penha
e caquis d'outro lugar
na cesta quero que tenha
tudo que pode levar
da feira de Saramenha
mas seu pudor vai ficar
cuidarei dele pequena
com saudade de matar
queroso: de novo venha
cá comigo se deitar...
sexta-feira, 5 de abril de 2013
Homicídio Coletivo
quinta-feira, 14 de março de 2013
aos primeiro de Março
só me faltam
três pros trinta
e me assaltam
dúvidas infinitas
seria essa uma crise
de meia-idade precoce?
Ou mais uma rebordose
de um velho adolescente?
vinte sete anos
com teto mas sem tento,
carreiras, filhos,
carros ou casamento
vinte sete anos
Três faculdades,
um livro publicado
e outro pela metade
meio mambembe vendo
meus versos de vagão
em vagão com que pago
a cerveja e o feijão
meio lixeiro recolho
pedaços de meu coração
remendo, costuro e colo
uma mentira sem tesão
três pros trinta
é pouco sucesso
mas muita tinta
três pros trinta
é muito verso
pra poema de quinta
domingo, 10 de março de 2013
Poeta
um poeta tropical de férias do mundo
no trem lhe faz feliz o riso e a careta
do leitor que se espanta no seu verso imundo
Verso alexandrino poesia barata
mesmo no calor do rio seu metro é fecundo
E o livreto de preço livre a fome mata
Podendo esse poeta viver vagabundo
Ele faz com os coelhos que nas suas tocas
dormem saindo só se a lua no Rio de Janeiro
surge no céu e nos trilhos o ritmo toca
As sandálias gastas do poeta mineiro
contam de seu calor nas terras cariocas
"usar sapatos não dá nesse braseiro!"
quinta-feira, 7 de março de 2013
SD
Tenta tenta escrever filho da puta
que cê tá doido doido demais
roda roda mas não chama o seu juca
cê sabe, isso é o que o brigadeiro faz
Doido, maluco beleza e batuta
só pelo poder de Jah me veio a paz
Tudo doce sem gosto de cicuta
e a moça do chapéu beija o rapaz
toca, toca mas não chama o raul
to louco, to na trava, bateu o sino
esse veio de Saquarema do Sul
todo excesso nos leva pro divino
Dionisio é melhor que Belzebú
sou ele na sua sede de vinho
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013
Um trabalho bem bolado
quinta-feira, 31 de janeiro de 2013
Vida
Vermes, em vossos ventres, vis vicejam
vão vagando famintos, verminosos
Vermes, em vossas veias, refestelam
virulências e vícios vultuosos
Vermes, que vos vomitam, vaticinam
vossa vontade vã e vossos vãos viços
virulentos, vazios, velhos que vingam
vagos vilões vilmente vos vividos
Venham ver, não vão passar d'uma aurora
vaga e vazia as vossas vastas vidas
num universo feito do inverso
Venham ver, vão passar num ir embora
voláteis visões das pessoas queridas
vagando voltando em prosa o verso
segunda-feira, 28 de janeiro de 2013
Noturno
toma-me com força
sou da chuva poça
de trocas veladas
e cartas marcadas
sonho que sou moça
de pele de louça
rara e bem cuidada
co'as roupas rasgadas
num toque faminto
por teus fortes dedos
nestes meus mamilos
mas, renego e minto,
seriam teus suspiros
nestes meus segredos?
quarta-feira, 23 de janeiro de 2013
Entre a Igrejinha e o Terreiro
De nascimento sou Mineiro
de comida boa com alho e sal
além de doces sem igual
mas vivo no Rio de Janeiro
Não eu num sei tocar pandeiro
surdo, bumba ou berimbau
Mas curto a onda de carnaval
do mêsdmarço inté Fevereiro
Eu larguei meus mares de montes
por mais um por-do-sol no cais
e versos com novo tempero
Vim dos mais belos horizontes
dessas minhas minas gerais
presse tão sacro pardieiro!
terça-feira, 22 de janeiro de 2013
Era pra ser um soneto..
Todos os dias eu travo
uma batalha sem fim
com as palavras
e o que elas querem dizer
com o que elas dizem pra mim
com o que elas dizem pra você
domingo, 20 de janeiro de 2013
Análise literária do soneto "Poeta do Hediondo" de Augusto dos Anjos
Os sons dentais das consoantes "d" e "t" auxiliam a sonoridade do poema a se apresentar como o tema de morte que finalmente surge ao fim do poema. Freqüentemente esses sons se encontram inclusive em posição de destaque sendo as sílabas tônicas de cada verso. Esses sons ecoam ao longo do poema prenunciando a temática fúnebre da morte.
Composto por versos heróicos o poeta demonstra uma capacidade única de domar o ritmo dos polissílabos. Feito raro na nossa poesia tão afeita a tijolos pequenos, o poeta aqui constrói não com azulejos o seu mosaico de versos e sim um castelo de sólidos e pesados componentes. A escolha dessas palavras faz parte do objetivo frio e certo do poeta, de uma poesia de ângulos agudos, de palavras diretas, onde muitos poetas floreiam e rodeiam o poeta em questão é direto, objetivo, científico. A agudeza de seus versos, o tamanho das palavras que escolhe e a maestria que consegue adequar tudo isso ao metro canônico é um feito hercúleo de raríssimas similitudes na língua portuguesa.
Na primeira estrofe temos um Algo que desperta o sujeito poético Algo que dispara as pancadas do coração por ameaçar sua própria vida tratada aqui como existência em seu sentido mais orgânico. A mortificadora coalescência pode ser vista como a própria morte quando o organismo cessa seus processos fisio-químicos que mantém o corpo em funcionamento, é quando todos os elementos do corpo passam a se movimentar para se tornar um só, voltar para a decomposição final uma única unidade de matéria.
E tal processo de morte descrito é causado por algo além do mero infortúnio, é a soma das desgraças humanas, mas não se trata de uma mera soma, é um somatório com fim, objetivo e função. A congregação das desgraças humanas é uma visão de que esses males atuam num processo escatológico, um processo destinado. Há um vaticínio, uma má sorte guiando essas desgraças a fim de resultar no fim do Poeta do Hediondo.
Na segunda estrofe, em seu primeiro verso, é retomada a idéia do coração que bate forte e intenso, são cavalgadas em seu peito que os desnorteiam, que o fazem alucinar. E justamente nesse delírio de agonia surge na mente uma consciência. Uma culpa de um misticismo cientificista que atribui as suas neuronas despertas pela agonia a capacidade de antever seu futuro.
Pela medicina de sua época uma Sonda em seu cérebro é decerto que post-mortem ou por si mesmo uma forma de morte. Com os versos que o antecedem compreende-se que é uma clarividência uma visão de seu futuro à mesa de autópsia. Tendo, inclusive um diagnóstico, um vaticínio sendo a sua causa mortis a mais hedionda generalização do Desconforto. Notando-se aqui um ponto importantíssimo no uso de maiúscula para gravar o desconforto, há uma entificação desse sentimento. Ele é tornado um personagem dessa história maldita. Algo que acompanhou a tanto o poeta que se torna por si algo além de um mero sentimento mas também um Ente de sua narrativa e quem sabe até seu verdadeiro Algoz.
(Augusto dos Anjos - EU E OUTRAS POESIAS)
terça-feira, 15 de janeiro de 2013
Danoso
Nas fotos eu a vejo
com um sorriso triste
de quem se faz tão feliz
quanto todos querem
Não sei mais o que bate
por sob seus belos seios
na camisola negra de dormir
nem se tem sonhos ou desejos
Sei que ela no seu quarto
ainda guarda o violino
que lhe dei com carinho
E dorme sobre sua cama
o urso de seu tamanho
escrito "Te amo" nos pés
domingo, 6 de janeiro de 2013
Ela
Vazio, medo, desamparo sem par
entre cacos das louças, panos, pratos...
tateia procurando o próprio lar
seguro e sadio do porta-retratos
Vela não encontra mas já sem ar
segura a lâmina tal amuleto
jeito perfeito de presentear
a sua dor com amargo sofrimento
Vaga, sozinha, perdida e estranha
seus olhos são um caudaloso rio
e queima frio seu coração e entranha
Vai segurando a faca pelo fio
morde sozinha uma raiva tamanha
que machuca seu lábio tão macio
Juventude
sábado, 22 de dezembro de 2012
Nutrição
picotei minha camisa
e fiz um suco de manga
ficaram fiapos de pano
grudados entre meus dentes
quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
Hai-kais Eróticos
*
terça-feira, 18 de dezembro de 2012
O mito do talento artístico e a valorização do artista.
segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
Diálogos que a gente vê por ai:
- Claro! O bicho não é burro o bastante pra jogar no homem!
domingo, 2 de dezembro de 2012
Ela, no espelho, sou eu
Pequenina e magricela
porém faminta como eu
tem um jeito de aquarela
que no pincel se perdeu
Pinta co's dedos a tela
dum jeito bem meu e seu
Assim bruta e singela
uma musa prum ateu
Sou narciso enamorado
por essa doce mocinha
que as vezes morre de medo
de ter o peito apaixonado
pela poesia daninha
que guardamos em segredo
terça-feira, 27 de novembro de 2012
O novo livro: Poeta Sobre Trilhos
Na foto: As 14 edições dos meus livretos (incluindo edição erótica) o primeiro livro: Sobre Máscaras e Espelhos, o livreto do Fora de Área, do Zuza Zapata e do Josué Carlos |
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
Poetas percorrem as ruas de BH e vendem seus livros diretamente
Divulgação
Ter um produto em mãos e sair por aí vendendo pode ser algo comum pra muitos empreendedores, mas quando esse "produto" é a poesia e o empreendedor é um artista, a coisa muda de figura. Para eles, o senso comum de que o Brasil não se interessa tanto pelos textos em versos não existe. Prova disso é que alguns destes trabalhadores autônomos das letras já chegaram a vender 35 mil livros em menos de dois anos. Uma prova de que eles conseguem, sim, viver de sua arte.
Há exatos 30 anos, o poeta Rogério Salgado, 58 anos, traça roteiros de caminhadas em Belo Horizonte e na Região Metropolitana para vender os livros que faz. Dessa vez, o bairro escolhido para esta entrevista foi o Padre Eustáquio, onde o autor já cultiva leitores. A tática dele é simples: abordar apenas comerciantes nas lojas. A explicação também é: "Eles já estão ali para atender o público. Ao bater na porta, a dona de casa pode estar ocupada, fazendo o almoço. Incomoda".
Na primeira loja, uma distribuidora de doces, o poeta vende o primeiro livro, sempre a R$ 10. Surpresas aparecem ao longo do caminho. Uma mini-biblioteca nos fundos de uma relojoaria é uma delas. "Aqui aparece todo tipo de pessoa vendendo coisas, obra de arte, essas bicicletinhas de arame para enfeite. Esse é um produto mais intelectual", pondera o proprietário da Relojoaria e Joalheria Tinkan, Osvaldo Lino. Ele compra o livro de Salgado e o posiciona na estante, entre um exemplar de Malba Tahan e um livro espírita.
Mais adiante, mais vendas, na ótica, na loja de roupas... "Ser poeta é a minha profissão. É o meu trabalho e eu acredito nele", resume Rogério Salgado. O autor calcula que já tenha vendido mais de 20 mil livros. O ano inicial dessa contagem é 1982, quando publicou "Tontinho", seu livro de estreia.
Outro exemplo de autor que se encarrega da produção e comercialização de seus livros é Lucas Lisboa, 26 anos, conhecido como "O Poeta Sobre Trilhos". No blog www.srpersonna.com.br ele expõe sua crença de que a poesia não pode ficar restrita somente às bibliotecas, aos saraus e livrarias.
Antes de publicar "O Poeta Sobre Trilhos" estudava filosofia e trabalhava como professor, em BH. Hoje, vive no Rio. "Tudo começou quando ia de Duque de Caxias até a universidade, de trem. Nesse percurso, tem venda de tudo nos vagões: ferramentas, CD, sabonete, meia ortopédica. Aí eu pensei, por que não poesia?".
Desvalorização mercadológica prejudica poesia
O autor faz livretos que já totalizam 14 números – cada tiragem é de 2.500. Ou seja, 35 mil livros vendidos em dois anos de atuação no trabalho. Quase um autor best-seller, se comparado com a vendagem convencional de títulos.
"Consegui furar a fila do mercado editorial. É um público que eu nunca teria na internet", constata Lisboa que se apropriou do formato de livreto – que tantos poetas como Glauco Mattoso, Chacal e Waly Salomão já utilizaram – e o adaptou para a grande escala do público dos vagões: "São cerca de cem livretos vendidos por saída para os vagões do metrô".
Mercado pode faltar, mas a criatividade para distribuir poesia, não. Há seis anos, o projeto "Pão e Poesia" estampa versos em pacotes de pão em BH e SP. "Até agora, foram distribuídas quase 1 milhão de embalagens", observa o idealizador do projeto Diovani Mendonça. "A partir do século 20, houve uma espécie de desvalorização mercadológica da poesia, afirma a pesquisadora em Poéticas Contemporâneas Vera Casa Nova. Ela diz que as publicações de autores novos também é rara. O que vende são os chamados "canônicos", autores como Drummond e Cecília Meireles. "Isso é grave, é uma diminuição da capacidade de pensar", lamenta Vera.
Há autores que apostam nas performances ou veem a internet como alternativa para a distribuição de sua obra. "O jeito é fazer isso mesmo. Muitos outros poetas, hoje com nomes consagrados, pagaram para serem publicados. Hoje isso continua".
Autoria: Elemara Duarte - Do Hoje em Dia
Fonte: http://www.hojeemdia.com.br/pop-hd/literatura/poetas-percorrem-as-ruas-de-bh-e-vendem-seus-livros-diretamente-1.61006
Romântico III
ele estende a mão e ela acha
que é pra lhe fazer carinho
mas ele só diz: me passa
minha garrafa de vinho
sexta-feira, 23 de novembro de 2012
Poeta
Lucas C. Lisboa
Eu passo partindo pratos
e durmo rangendo dentes
Eu peco sem celibatos
quando me quebro as correntes
Mato e me roem os ratos
Morro e me cremam os crentes
Pois vivo rifo recatos
para meus doces dementes
Nos muros mando recados
se me rasgam os bilhetes
Pois espalho arcos alados
purpurinas e confetes
Eu falo pelos calados
e berro pelos falantes
Faço versos cravejados
de ouro, de prata e de amantes
terça-feira, 20 de novembro de 2012
Banal
em folhetim revista ou jornal
nem caio bem na coluna social
e nem no diário de coração
eu sou poeta do dia mais banal
da coisa já sem brilho ou razão
do instante mínimo além do tesão
típico do caderno marginal
falo da menina quase sem graça
que acha graça da minha cantada
falo dos belos mendigos da praça
que transam na fonte de madrugada
falo da minha poesia de raça
impura e filosofia renegada
Tour monetário e a mecenas de cabelos vermelhos
Além de ganhar chicletes de canela de lindas meninas, chocolates de doces senhoras, coca-cola e pururuca dos vendedores do trem e poesia dos poetas que encontro ao vender meus versos nos trilhos. Há uma outra coisa que sempre é divertido quando acontece. Que é quando recebo moedas estrangeiras! Sim, eu já estou fazendo um tour monetário com os diferentes trocados que recebo em troca dos livretos.
Tem moeda do peru que ganhei de um mochileiro que estava cruzando o pais, um dólar americano que ganhei de um casal que estava falando em inglês mas eram brasileiros, um dólar octogonal canadense que não sei quem me deu... É... eu não sei quem me deu pois tenho o costume de agradecer pelo livreto comprado mas não olhar o valor recebido. Gosto de poder tratar com a mesma simpatia o leitor que me dá centavos e o que me enche de notas.
Normalmente não conto o dinheiro até o fim do dia. Apenas retiro as moedas do bolso quando começa a ficar pesado demais e jogo dentro da bolsa de moedas. Após horas vendendo poesia ali nos trilhos essa bolsa fica parecendo uma algibeira medieval. E costuma fazer a alegria dos caixas de supermercado e bares que eu vou. Não são raras as vezes que eu escuto um: Acabou nosso problema de troco!
Falando em fazer a alegria, uma jovem mulher de cabelos curtos e pintados de vermelho realmente acreditou em meu sonho de levar a poesia a lugares onde ela nunca esteve. Já era tarde e eu tinha acabado de chegar até a Pavuna e me sentei distraído num dos bancos para arrumar minha bolsa e voltar a vender na volta.
Ela chegou toda tímida e me perguntou se eu ainda tinha dos livrinhos, acostumado com as pessoas que mudam de ideia na última hora e querem levar pra casa o livreto acabei abrindo a bolsa e peguei um livreto e entreguei para ela com um sorriso cansado. Ela pegou o livreto, guardou na bolsa e colocando minha mão entre as dela deixou uma nota muito dobrada dizendo para que eu não desistisse do meu sonho. E foi embora muito apressada sem me dar tempo de agradecer ou dizer nada. Foi o maior valor que eu já recebi por um livreto mais que o dobro do maior anterior.
Trabalhei contente não só pelo valor mas também porque vi que de norte a sul do Rio de Janeiro havia quem se encantasse por poesia, havia quem valorizasse o que eu faço contribuindo cada um a sua maneira para a poesia continue a viajar sobre os trilhos dessa cidade que acolhe os artistas com tanta alegria.
sábado, 17 de novembro de 2012
Para "A queda" um band-aid
que meu prazer é um mal
censura se me lambuzo
com delícias sem igual
Se rejeito tal abuso
é pecado capital
me acusa d'outro desuso
de ser crente do infernal
Pois eu rejeito esse intruso
não me cabe culpa e moral
E sem fé bem que lhe acuso
de ser anti-natural
Pois vestir calças é russo
no meu pais tropical
Me deixe que não lhe fuço
na sua vidinha sem sal
quinta-feira, 15 de novembro de 2012
Dia de chuva
pra alinhar todo meu mundo
como se ele fosse um terno
que se molhou num dia frio
Tentei consertar meu erro
encher de nada o vazio
jurando que seria eterno
só por mais esse segundo
Eu queria ter no meu peito
um algo que desse jeito
de chamar de coração
Tenho é um vazio perfeito
um belo sonho desfeito
que me canta a solidão
Ramalhete de palavras
são tudo que tenho a lhe oferecer
pra provar, pulo muros e janelas
espalho doces versos pra você
Cândidos cravos junto a rosas belas
eu trago pois se fosse seu querer
pintaria nas mais vivas aquarelas
só prum riso de seus lábios nascer
tenho duas mãos e a mente apaixonada
singro mares de morros, cruzo montes
quebro prantos e medos mais medonhos
eu simplesmente sei que é minha amada
pois em toda a arte somos amantes
nosso castelo é de pedras de sonho
quarta-feira, 14 de novembro de 2012
Diálogo entre o Dândi e o Trapeiro
-Você é um imbecil meu caro. Olhe essa cor vistosa! É um verde rubi de mais fina estirpe. Que importa se suas mangas estão poidas e seu acabamento não é mais o mesmo. Nas ruas escuras seu verde reluz o vermelho das lamparinas.
-Que me importa o quão reluzente seja? Me importo é com seu tamanho, ganho pelos palmos de pano que levo ao artesão. E esse casaco, tem forros internos, externos... É trapo que não acaba mais!
-Não o chame de trapos! É um design moderno, arrojado que acaba de cair em desuso na corte. Mas com os ajustes certos, a postura certa me faço em estilo e nobreza. O refinamento está na alma e em saber encontrar ouro onde os outros só vêem lixo.
-Chama de lixo meu trabalho? Seu verme vagabundo! Ganho com essas tralhas que ajunto o meu sustento. Melhor que você que escreve poemas e declama em troca de uma moeda ou uma caneca de vinho. Pelo menos meu trabalho não depende da caridade de ninguém.
-Meu caro amigo, não é isso que eu quero dizer. Mas a verdade é que dá para se viver no luxo só com o que se acha na porta da casa dos homens e mulheres direitos. São as melhores indumentárias, descartadas no afã da moda, os melhores adereços por terem sido ganhos do amante ousado e é claro até um quadro ou outro que fora dado por um parente que insiste em mecenar certos fracassados como nós.
-Não se iluda seu almofadinhas, essas roupa que usa, essa bengala, nada disso lhe faz parecer um dos que moram nas casas da avenida principal. Continua reles proletário, longe dos salões burgueses. Quando muito a Boemia pode abraçar. Somos de outra espécie de homem, bem mais baixos na cadeia alimentar.
-Vidrados no dinheiro, eles e você, não podem aproveitar a vida e nem o perfume da rosa. Veja aquela bela dama que atravessa a rua apressada, vê como é formosa!
-Pensa que me engana? Não levara meu trapo assim tão fácil. É tecido meu achado primeiro.
-Se o que queres é papel, tome cá esse livro. Pode vendê-lo ao artesão e ganhar mais moedas que ganharia com esse casaco.
-Me parece uma boa troca... Você deve ser louco! Trocar papel caro por um casaco sem valor.
-Cada um sabe o valor que dá ao que estima, esse casaco com certeza me ajudará a adentrar debaixo d'uma saia feminina.
-Seu lascivo! Isso lá é coisa que se diga na rua?
-Deixe disso, pare de me julgar pois agora vou-me indo atrás de um novo par.
-Mas espere ai! Isso aqui é uma bíblia! Como imagina que eu possa vender isso? É pecado!
-Pecado nada meu bom amigo, quando a fome a aperta Deus sempre está do nosso lado!
terça-feira, 6 de novembro de 2012
Cego
canta bem melhor
no escuro perfeito
lhe feito sem dó
O saci do gueto
pula na maior
dum barraco pro outro
cuma perna só
mal não se renega
pois é desatino
não levar sua cruz
mariposa cega
tem no som do sino
seu facho de luz
domingo, 21 de outubro de 2012
Acelerado
num gozo raro
e quero raso
num riso solto
Não sei se passo
ou não do ponto
no que eu aposto
sem um centavo
Eu quero à vista
do sonho cego
e quero à prazo
desregulado
Não sei se fico
num beijo morno
ou se me vazo
como um cachorro
terça-feira, 2 de outubro de 2012
Primavera de Ocasião
verdes araras urbanas
colorem um céu cinzento
num tchau pro fim de semana
Adorável Canalha
Caminhando pela rua ele veio em direção contrária a minha, olhou-me nos olhos, passeou pelos meus cabelos, desceu por meus lábios e enquanto sorria seus olhos secaram meu decote. Passou por mim, mas eu pude escutar seu telefone tocando:
-Oi amor, não paro de pensar em você!
sexta-feira, 21 de setembro de 2012
Livreto colorido, a gentileza dos seguranças e um recado pela janela do ônibus
Chegaram meus livretos novos! É a primeira edição colorida! Consegui encontrar uma gráfica graças ao Zuza que faz o trabalho por um preço mui acessível, acabou ficando a cópia mais barata que seria no xerox que eu costumava ir. E o melhor, posso pagar com cartão de crédito e só pagar os livretos muito depois de vendê-los.
Eu gosto do requinte que é usar as próprias engrenagens do sistema para subvertê-lo. Tento todo dia encontrar novos meios de usar a nossa querida industria capitalista que explora igualmente meios de transporte, graficas e cultura contra a sua própria estrutura.
Os novos livretos ficaram muito chamativos! Os leitores adoraram e foi um dia de intenso movimento nas estações. Acabei sendo pego em Cantagalo mas foi tranquilo, achei que ia dar algum problema mas os seguranças foram muito educados comigo e só me tiraram do sistema. O grande problema é que eu estava em Cantagalo e ali é longe demais das duas estações mais próximas.
Acabei optando por caminhar pela Rua Barata Ribeiro até chegar a estação Siqueira Campos onde voltei ao meu trabalho habitual de espalhar a poesia pelos trilhos do metrô. Nesse vai e vem cheguei até a Saens Peña e voltei vendendo vagão a vagão. Não é que dentro de um desses, na altura da Carioca, não encontro um amigo que bati bons papos na praça São Salvador?
Ele me convidou para a São Salvador, para beber um pouco e papear. Um chorinho aqui, uma conversa de cá, algumas latas de cerveja depois era hora de ir embora. Caminhei até o Largo do Machado onde pus em prática um truque carioca que acho o máximo.
No rio o transporte público é caótico e muitas vezes as empresas de ônibus lhe obrigam a pegar duas conduções para chegar a um destino cuja distância não é lá tão grande para justificar duas passagens. Com isso surge o Surf de ônibus que consiste em entrar no primeiro ônibus que vai na direção que você quer e perguntar se vai para onde você quer. Se for, que maravilha! Tá chegando em casa rapidinho, se não. Você desce e está um pouco mais perto de casa...
Já tive que surfar umas três vezes para sair do Largo do Machado e chegar na Lapa, mas dessa vez o motorista foi bonzinho comigo e me deixou na lapa. Uma gentileza que deixou minha noite mais feliz. Entrando no ônibus perguntei ao motorista se ele parava no ponto onde eu teria que descer para chegar em casa. Antes do motorista responder uma moça simpática me respondeu que sim, que ele passava por lá e então ela girou a roleta e foi se sentar.
Encantado por essa gentileza dela, passei pela roleta e ao passar por ela entreguei um livreto de poesia e agradeci pela informação. Sentei lá atrás do ônibus e continuei minha viagem pensando no dia seguinte, nos livretos que teria de dobrar e grampear para encarar mais um dia de poesia sobre trilhos e tudo mais. Mas a hora de descer ela me jogou pela janela do ônibus um recado muito singelo que dizia assim: "Obrigada! A arte ainda vai salvar o mundo!" E tinha um monte de beijos de batom naquele bilhete. Num dos cantos um rabisco, que eu acho que era seu telefone que ela rabiscou por algum motivo que nunca vou saber.
sábado, 15 de setembro de 2012
Eu-miragem
se sempre acham que poetas
não sentem fome nem sede
de mil maneiras diversas?
que faço se sou medonho
no mesmo reino de quimeras
que também me fazem príncipe
sem perguntar meu querer?
Sou o cavaleiro que amada
sonha mas não quer que volte
pra sempre poder amar
Eu sinto que sou miragem
que querem nunca alcançar
mas contentam em estar lá
sexta-feira, 14 de setembro de 2012
Chuva, Luto e Recital sobre trilhos
Nem todo dia é dia de poesia. E o Rio de Janeiro não cansa de me surpreender. Jamais vou compreender o porquê exato do luto sempre que chove na cidade maravilhosa. Entrei dentro do metrô e me choquei com as caras mal-humoradas de todos. Sério, tava todo mundo com cara de enterro. E tudo porque caia uma leve chuva que para mim só tinha aliviado o calor estranho que se abateu na cidade em pleno inverno.
Caras de enterro, pessoas mal humoradas e eu parecia ser uma presença errada e feliz num ambiente onde todos estavam celebrando o enterro do sol. E assim eu fui de Saens Peña até Gal. Osório (alguém já reparou na quantidade de penha que tem aqui no rio? É Penha, Penha Circular, Alto da Penha, Saens Peña... Depois eu tenho que pesquisar e descobrir de onde vem esse nome). Foi uma viagem daquelas de poucos amigos, mas encontrei alguns rostos conhecidos, alguns clientes habituais que já fazem coleção dos meus livretos e tudo mais. Mas a esmagadora maioria tava mesmo afim de só voltar pra casa e se recostava nos bancos de olhos fechados.
Na volta de Gal. Osório para Saens Peña tudo seguia no mesmo ritmo até que uma senhora, de cabelos loiros pintados, que estava de pé pegou um livreto meu e começou a lê-lo em voz alta para os amigos e tudo virou uma farra naquele grupo. Todos rindo felizes e contentes a poesia viva na voz dela. Foi um lampejo de felicidade num dia tão cinzento. Colocou cor no dia e mostrou que a poesia pode vencer as nuvens mais carregadas.
Eu fiquei ali curtindo aquele momento espontâneo de poesia no metrô, foi delicioso e me deu uma revigorada daquelas. Tão envaidecido que perdi o tempo das estações e quando vi paramos na Uruguaiana e o vagão ficou apinhado de gente, completamente lotado! Pois é, paguei o preço pela minha vaidade e foi com muita dificuldade que consegui pegar os livretos de uns poucos que queriam devolver e de muitos que animados pelo recital iam levar pra casa os livretos.
Sai do vagão depois de dar um livreto de outra edição para a simpática senhora e quando sai ela voltava a ler os poemas em voz alta para seus amigos. Chegando no vagão seguinte senti o cansaço por ter trafegado pelo vagão lotado e a despeito da alegria do vagão anterior esse estava morto novamente, com caras mal humoradas. É, eu desanimei e aproveitando a deixa que o vagão estava chegando na minha estação desci e fui para casa.
sábado, 8 de setembro de 2012
Para uma poetisa de mão cheia
e um ralhar mais severo não só irrita:
deprime e propicia males piores...
mas elogio vão nem cai bem na fita!
Linguagem rebuscada, rimas pobres
pois escreve sonetos como se imita
poetas mui antigos por uns cobres
não vê que cega, tolhe e se limita?
Queria ver mais esmero na escansão
mais sabor, tino e crítica na rima
e um versejar mais solto com sua pena
Aprenda no repente e na canção
a amar como mulher e tal menina
brincar com os mil sons desde pequena
quarta-feira, 29 de agosto de 2012
Quando a leitora persegue o poeta
Quarta-feira, fim de mês mas meu ânimo estava inquieto pois já havia alguns dias que eu não saia de casa e nem escrevia nada. Ficava ali vendo filmes, lendo um pouco e namorando um bocado. Eu precisava sair, entrar num metrô e atiçar com poesia um monte de gente diferente.
Escolhi o itinerário da Pavuna pois era durante o dia e os vagões estavam menos cheios. Mas como era de se esperar estava todo mundo duro e a quantidade de moedas era muito maior que das notas. Assim os livretos até que estavam ganhando donos rapidamente mas os livros nem tanto.
Terminei mais um vagão e mudei para o próximo, passou mais uma estação e uma mão me puxou a camisa. A mão pertencia a uma menina morena de óculos e cabelos cacheados que me disse que eu havia esquecido dela no vagão anterior. Sim, ela mudou de vagão para pagar pelo livreto! E o mais inacreditável é que ela estava sentada no vagão e agora teria que viajar em pé.
Para compensá-la minimamente lhe dei um livreto extra afinal sempre carrego pelos menos alguns livretos das duas edições anteriores para completar a coleção de alguns compradores habituais. Entretanto a dedicação e o esforço dela não me foram uma recompensa muito maior que as moedas em si. O resultado foi um sorriso bobo em meu rosto pelo resto do dia.
Esse foi o ponto alto da tarde que me aguçou mais a vontade de trabalhar nesse período . É um público diferente do noturno que estou mais acostumado. Um público que vale à pena cativar. Foi bom saber que não só os homens de preto podem me perseguir de vagão em vagão mas que os leitores que desperto também!
terça-feira, 28 de agosto de 2012
Doutor Adevogado
pasta de couro e relógio
no bolso nada de cobre
só notas de valor régio
Papéis que lhe versam sobre
assuntos e bens valiosos
que ameaça contra o pobre
e deixa ricos charmosos
tem no peito seu inimigo
que canta na madrugada
tal um bêbado risonho
mas sei que há muito mendigo
trajando terno e gravata
pedindo um pedaço de sonho
sábado, 18 de agosto de 2012
Código de Barras
um reles papel comprova:
eles sabem meu endereço!
Tem meu nome, CPF
CEP e código de barras
tudo isso pra me cobrar
Cada conta vencida é praga
que faz tocar telefone
bater porta e campainha
tira o sono e me arranca
os cabelos da cabeça
incomoda sem parar
Sabe, cada conta paga
eu trato como troféu
que guardo com muito zelo
É tipo meu amuleto
um espanta-cobrador
por pelo menos um mês
segunda-feira, 13 de agosto de 2012
"ô da poesia"
sexta-feira, 10 de agosto de 2012
3-6-9
pela boca da moça que ginga
pelo som feito samba pra lua
e pro sol no cabelo e na rua
ela passa sem pressa ao léu
e devora sem pressa seu réu
em um crime bem feito e traçado
pra pisar noutro peito amado
forte e amargo pigarro de pinga
pela boça do moço que xinga
pelo tom pelo som pele nua
numa fome da carne mais crua
ele passa seu dia no bordel
devorando na noite sem véu
seu passado presente e futuro
feito verso bem claro no escuro
Certeza Universal
de mim, dele ou de tu
nem é uma vontade imposta
por deus ou por belzebu
Pois eu lhe faço uma aposta
Caralho, buceta ou cu
sei que todo mundo gosta
e quer pelo menos um
Mas passa mês, dia ou semana
com o tesão contrafeito
quer qualquer um no seu leito
Tara é coisa muito humana
que todo e qualquer sujeito
estará sempre sujeito
domingo, 29 de julho de 2012
Abençoada e ungida
de olhos azuis
e de pele branca
que rubra reluz
moça que me encanta
com sua doce cruz
que bem me levanta
e pra fé faz jus
eu vou lhe abrir
todas as marés
com louvor e pranto
eu quero lhe ungir
da cabeça aos pés
com meu óleo santo
quinta-feira, 19 de julho de 2012
terça-feira, 17 de julho de 2012
Procura-se Revisor de Livreto Caseiro de Poesia
Outro dia no vagão do trem um singelo senhor de seus 40 e tantos anos, de óculos e barba. Um tipo daqueles com ares de intelectualidade e sapiência. Veio me dizer que não levaria meu livreto porque havia nele terríveis erros gramaticais que não seriam desculpáveis nem sob a luz da métrica, estilística ou licença poética.
Obviamente desconcertado e envergonhado admiti a culpa e perguntei solícito se ele poderia me apontar os erros. A resposta veio seca: sou revisor, para esse serviço só pagando. E eu fiquei olhando para a cara dele meio embasbacado sem ter uma reação prevista ou em pensamento.
Mais tarde revisei o livreto com olhar crítico poema a poema, verso a verso. Não encontrei nada que não se justificasse por uma rima, por um metro mais teimoso. Todo esse rigor do revisor só pode ser para justificar o seu ganha pão, será que ele achou assim tão absurdo alguém viver de poesia? Ou será mesmo que ele acha que eu poderia querer contratá-lo para revisar meus livretos?
Ele ainda se safou dizendo que só criticou pois viu que tinha ali algum valor, leu tudo, do primeiro ao último poema, mas será que foi só sadismo para me desconcertar ali ou será que não entendia tão bem assim de versificação mas somente de gramática pura?
Bom, pelo sim pelo não... Fica ai aberta a vaga de revisor de livreto de poesia do poeta sobre trilhos! Não quero mais passar vexame dentro dos vagões.
sexta-feira, 13 de julho de 2012
Passado, Presente e Perigo nos Trilhos.
Viver da poesia sobre os trilhos do trem me faz sentir como se eu voltasse no tempo, e refizesse os caminhos de meu próprio avô, pois ele durante as décadas de 40,50 e meados de 60 viveu e criou sua família como comerciante da Estrada de ferro Bahia Minas que partia de Arassuai (sim naquela época Arauçuai tinha até outra grafia!) e ia até Ponta de Areia na Bahia.
O Natalino pai, nascido em 25 de dezembro, alugava um vagão do trem que ficava estacionado próximo de sua venda em Alfredo graça que era a primeira parada após o trem partir de Arassuai. O Natalino Filho (meu pai que não era nascido no natal mas ganhou o nome por capricho de meu avô) me conta que ele com seus 7 anos brincava no armazém onde havia montanhas de grãos de feijão e de milho.
Meu avô carregava o vagão com milho, melancia, feijão, farinha de mandioca e demais produtos produzidos na região. No percurso do trem ia aos poucos esvaziando o vagão e enchendo-o novamente com tecidos, perfumes, ferramentas e outros tantos produtos que chegavam ao porto.
Mas isso mudou pois no ano seguinte ao golpe de 64 os militares assinaram um decreto desativando a Estrada de Ferro, sem a estrada não havia mais como escoar a produção da região e meu pai pegou em 66 o último trem para Araçuai onde minha avó se tornou gerente dos correios e meu avô fazendeiro.
Essas divagações me vieram quando vejo a insensibilidade do metrô que não se importa com a natureza do que se trata o livreto com o qual estou despertando os leitores. Eu acabo vendendo muito no metrô mas ali a venda de poesia não é uma atividade muito bem quista pelos seguranças.
Quando entro em um vagão tenho que tomar cuidado para ver se não tem um segurança a bordo, eles sempre me chateiam. Era o segundo vagão da noite, entrei e caminhei até o fundo dele quando reparei quase imperceptível um segurança, ele me notou. Esperei sentado no percurso até a próxima estação e quando fui trocar para o vagão de trás o nosso amigo veio me seguir. Aquela situação estava chata e eu tive que pensar rápido. Quando o apito do metrô soou para as portas se fecharem eu saltei do vagão. E a porta se fechou atrás de mim sem que desse tempo dele continuar atrás. A verdade é que me senti meio que num filme de ação e tive que resisitir a virar e dar tchauzinho para o homem de preto. Sentei na estação, tirei os óculos, vesti o agasalho longe das cameras de segurança e fiquei jogando no celular até o próximo metrô passar.
Ser poeta sobre trilhos, talvez o único poeta underground (literal) do rio, é um enorme prazer. Ver o sorriso no rosto alheio, os olhares encantados, a felicidade estampada vale os riscos. Ninguém pode me tirar esse prazer, principalmente quando sei que são milhões de leitores adormecidos que passam por ali todo dia, aos poucos eu vou conseguindo levar até eles. Oito mil livretos vendidos nesse processo que já dura seis meses. Mas a pergunta que me move é: você tem ideia do que pode uma mente que voltou a usar a sua imaginação?
terça-feira, 10 de julho de 2012
Poeta e apenas poeta
Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" faço versos e de quado em vez me arrisco na prosa.
Em tempos tão performáticos e midiáticos há espaço para um poeta que seja apenas poeta? Há espaço para quem apenas aprecia a arte da escrita, que gosta de observar a leitura silenciosa de seus versos? Que gosta do efeito de um poema que ao terminar de ser lido seja relido e lido novamente?
Eu, sinceramente achava que não, acreditava que jamais faria sucesso como poeta por não saber e nem querer, cantar, recitar, declamar ou mesmo sapatear com meus versos. Tá, eu confesso, era uma mistura de timidez com falta de jeito para as demais artes. Porém o que é dificuldade e barreira também é o estimulo para a invenção.
O Poeta sobre Trilhos surge como um personagem capaz de levar a poesia para um público amplo sem depender do suporte de outras artes como a retórica, a música ou as artes cênicas. A poesia, somente a poesia em papel e tinta se basta na tarefa de levar o prazer de si mesma para os leitores.
Nada de declamação, nada de piruetas ou acordes de violão. Dentro de cada vagão levo apenas meus livretos de poemas. Oito páginas com minha poesia bem diagramada e com letras grandes para que todos possam ler, mesmo aqueles que já estão com os braços curtos e esqueceram os óculos em casa.
Sei que é lindo ter uma platéia cantando junto suas músicas ou gargalhando em sincronia com sua atuação. Mas sou eu muito feliz de poder ver a sinfonia silenciosa das expressões de meus leitores dentro dos vagões.
sexta-feira, 6 de julho de 2012
Relembrando a mudança de endereço....
Poeta Sobre Trilhos em: Poesia sabor canela!
Um chiclet de canela por um livreto de poesia me parece uma troca surreal. Mas muitos dizem que é surreal viver de poesia hoje em dia. E é isso que eu venho fazendo há um ano e meio na cidade do Rio de Janeiro.
Como assim um chiclet de canela por um livreto de poesia? Me perguntam embasbacados. Talvez por não saberem o que eu faço do meu dia a dia isso torna-se mais impossível. Porém eu reconto, eu vendo poesia dentro dos vagões do metrô e do trem da capital fluminense (aprendi a pouco tempo que carioca é só quem nasce na cidade e o natural do estado é o fluminense!).
Distribuo dentro de cada vagão cerca de 30 livretos e espero a reação dos leitores. É sempre fascinante ver como cada pessoa reage ao ler poesia depois de muito tempo e até mesmo pela primeira vez. Tem quem folheie desinteressado e depois largue pra lá, quem devore tudo com avidez e vontade, quem lê esquece do mundo ao redor, enfim gente de todo tipo com reações de todo tipo!
Mas voltando ao chiclet de canela, tinha uma linda menina de cabelos loiros lisos, aparelho nos dentes e não mais de treze anos que estava com a mãe dentro de um vagão. Ela lia com muita avidez que eu pensei até que ela nem se lembraria de me pagar ou devolver o livreto.
Eu estava enganado porém antes de ir abordá-la recolhi e vendi os livretos que restavam no vagão e fui lá preparado para pedir de volta o livreto. Minha surpresa foi quando ela me disse que não tinha dinheiro pois gastara complando um pacote de trident de canela. Olhou pro trident e me perguntou se eu aceitava o chiclet em troca do livreto.
Eu só ri surpreendido e feliz. O escambo é algo maravilhoso, a troca de um objeto por outro é melhor e mais mágico que a troca por dinheiro. Ela trocou algo que dava prazer a ela por algo que estava lhe dando, talvez, ainda mais prazer! Não estava trocando um prazer de fato pelo prazer potencial do dinheiro, era algo tangível e completo.
Eu assim nunca fui o maior fã de chiclet de canela mas desse dia em diante ele me surgiu como um sabor fantástico, um sabor de lembrança e de sonho. O de saber que uma doce menina no auge dos seus treze anos se encantou por meus versos.
E como eu sempre digo, minha vida não dá um livro porque é inverossímil demais. Estou escrevendo esse relato que procrastino há duas semanas justamente porque voltei a encontrá-la. Saindo da estação Afonso Pena lá estava ela, sorrindo pra mim e perguntando se tinha poesia. Eu não reconheci na hora, mas quando ela sacou o envelope de chicletes...
sexta-feira, 29 de junho de 2012
quarta-feira, 6 de junho de 2012
O Homem de Preto disse sim pra poesia
As coisas estão mudando ou estou tendo mais sorte que o costume. Um homem de preto leu meu poema em voz alta no vagão! Sim, parece surreal depois de tantas desventuras e problemas mas aconteceu.
Foi mais ou menos assim, estava eu lá na estação de Gal. Osório, parada final, distribuindo meus livretos quando entraram dois funcionários do metrô que pelo uniforme eu sabia que se tratavam de caixas e por isso nunca se incomodavam em ler meus versos, muito antes pelo contrário.
Entreguei meus livretos para ambos e terminei de preencher o vagão com poesia e me sentei foi quando ele, o homem de preto, entrou e na hora eu praguejei pois perderia todos aqueles livretos por causa da encrenca. Sem muita surpresa ele foi conversar com os dois outros funcionários, com apreensão eu o vi pegando o livreto e com absoluta surpresa o vi lendo e ainda por cima lendo em voz alta.
Vendo aquilo fiquei totalmente sem reação, meio ainda sem entender fui desconfiadamente recolhendo os livretos. Eu conversei com um casal universitário que adorou o projeto despertando leitores e lá eu me demorei na conversa para me acalmar um pouco.
De uma ponta a outra recolhi vagarosamente de cada um dos presentes até chegar naquele confronto inevitável que para não abusar da sorte eu esperei chegar na estação de Botafogo para na troca de vagão simplesmente anunciar aos dois caixas que os livretos eram presentes.
Pude ver que o segurança riu de meu medo e desconfiança, mas gato escaldado tem medo de água fria. Depois de tantas desventuras com os homens de preto já tava de bom tamanho que meus versos foram bem aceitos e degustados com prazer.
terça-feira, 22 de maio de 2012
Canto ao Guerreiro
Sangrando o ar com sua espada
o cavaleiro sustenta
sozinho pela lembrança
dos beijos da bela amada
Não baixa nunca sua guarda
em uma luta sangrenta
contra as sombras dessa herança
que lhe ergue e lhe mata
É guerreiro bravo e forte
algoz dos vermelhos dragões
e também de homens e feras
Rei no sul vilão no norte
herói na costa e sertões
será lembrado por eras!
domingo, 6 de maio de 2012
Maternidade
Eu por ter nascido homem
nunca soube nada sobre
o que é ser mulher
ou conceber um filho
Porém como poeta
Eu sei bem como é
quando o verso solto
fecunda minha mente
E cresce até se tornar
pequena e timida estrofe
depois ganhar corpo
e também ganhar forma
Orgulha-me se vira um poema
daqueles, garboso e forte
e cheio de melodia que conquista
um outro coração incauto
Despertando outro poeta
semeando dentro dele
um outro verso
de pura inspiração
Que crescerá noutro
papel de pauta marcada
para uma outra alma
lê-lo e espalhar por ai
Não sei se é um sentimento
sequer próximo ou parecido
o dom de criar no papel
e a benção de dar a vida
Mas já me contento
se meus versos gestados
embalarem uma canção
de ninar de uma Mãe
quarta-feira, 2 de maio de 2012
Café com leite
O negro de forma bela
e cheio de melanina
com esse seu olhar mela
a nina de uma menina
De pele branquinha ela
se faz tão doce e felina
que arrepia toda aquela
nuca atrás da trança fina
Sim, negro garboso e afro
de cabelos de tantas tranças
seduz os olhos da gringa
Ela se sonha no sarrafo
dele enquanto dança
dura seguindo sua ginga
quarta-feira, 25 de abril de 2012
Mudança de endereço!
sábado, 21 de abril de 2012
O Pivete e o Homem, exercícios do papel de macho.
Caminhávamos ali pela mem de sá antes de chegar aos arcos da lapa quando chegou um menino de pequeno de menos de 12 anos e olhou no fundo dos olhos dela e puxou sua correntinha de ouro do pescoço e saiu correndo.
Eu não pensei duas vezes e corri atrás do moleque, ele tentou se enfiar no meio da multidão mas antes disso eu o peguei e ele caiu no chão. Gritei com ele perguntando cadê a corrente até que ele desesperado, sim o olhar dele tinha muito medo, me falou que tava no chão e apontou.
Ainda fora de mim levantei ele do chão com um movimento só e as pessoas ao redor já se agitavam querendo que eu chamasse a polícia. Nesse momento eu só via o olhar de pânico do garoto e soltei ele. Quando falaram em polícia eu fiquei morrendo de medo do que eles poderiam fazer com aquele menino.
Deixei aquele lugar meio atabalhoado, uma moça até chegou próximo da gente perguntando se a gente não ia mesmo chamar a polícia e um cara veio mostrando uma outra correntinha perguntando se também era nossa. Negando a ambos atravessamos os arcos da lapa finalmente. As ruas estavam cheias de gente mas eu não via ninguém. Minha cabeça estava um caos, fervilhando de pensamentos e meu peito de sentimentos contraditórios.
Depois que a adrenalina se diluiu em meio ao meu sangue me senti duplamente mal por tudo isso. Primeiro por ter causado todo esse horror no moleque que é uma criança e depois por ter obedecido a todo o adestramento social que faz do homem esse animal, o sexo masculino é ensinado, desde criança, a ser uma espécie de cão de guarda.
Fiquei imaginando as merdas que aqueles policiais poderiam fazer com aquele menino que sequer tem idade para ter discernimento de algo. E também imaginando o que eu poderia ter feito se não tivesse visto aqueles olhos dele em pânico. O pior é que por mais bestial que tivesse sido meu ato, ele seria apoiado por todos ao redor, teriam visto e dito que o "ladrãozinho" mereceu. Como é que uma criança dessas poderia ter merecido algo assim? Só aqueles olhos, só aquele medo que dava para sentir o cheiro já foi muito além da conta que ele merecia.
Dentro da van indo para casa tive ódio de mim mesmo, por ter feito exatamente como fui adestrado pela sociedade a fazer. A proteger meu território, a responder imediata e com violência ao ato. Não pensei, só agi como fui condicionado a agir. Nós homens somos criados para agir com essa violência desmedida desde o início, em jogos competitivos, em brincadeiras com espadas.
Essa "educação" fez acontecer esssa pequena corrida ao pivete mas também faz acontecer todos os dias os socos no olho porque o cara mexeu com sua mulher, as facadas no ventre por que o cara lhe olhou torto e muitos e muitos óbitos que só acontecem porque nossa sociedade adestra os homens para serem cães de guarda prontos e preparados para atacar ao menor sinal de ameaça ao seu território.
Ela ficou feliz por ter de volta a corrente que tinha um pingente de sua avó, me agradeceu por isso. Me fez algum elogio pela minha "coragem". Sim, como bom macho alfa eu mostrei minha força para defender a fêmea que estava comigo. Que revolução sexual, que igualdade de gêneros há nisso? Até quando vamos criar nossos filhos nesses dois papéis rigidos e opressores? Isso tudo me fez chorar dentro daquela van, já sem adrenalina, pois ao invés de ficar mais calmo todos esses pensamentos me deixaram ainda mais atordoado.
A violência fisica é uma escola que botamos nossos filhos machos desde seus primeiros anos de vida. Foi por essa escola que era eu homem correndo atrás de um aprendiz de homem. É a mesma escola que o empurrou para cometer esses delitos e também leva sua irmã a se prostituir. Foi por essa escola que 70% das mortes violentas são de homens. É nessa escola de violência que se baseia nossa sociedade que ainda oprime as mulheres e massacra os homens.
Aquela correntinha arrancada, com o pingente da avó. Me fez ver como ainda sou de certo modo um cão de guarda protegendo a coleira. Defendendo com unhas e dentes uma sociedade opressora, uma animalização do homem terrivelmente intensa. Um cão de guarda e só.
terça-feira, 3 de abril de 2012
Analise literária do poema: Também já fui Brasileiro de Carlos Drummond de Andrade
O poeta narra seu próprio fazer poético como provocante, causador de desejos e aversões por sua habilidade poética mas num verso "Mas/ a/ca/bei/ con/fun/din/do/ tudo." ele perde inclusive o ritmo cunhado nos versos anteriores ao fazê-lo um eneassílabo. Justamente onde o eu lírico diz ter "confundindo tudo" o poeta imprime ali um ritmo diferente o que demonstra imediatamente o caráter ambíguo da crítica aos poetas escrevedores de poemas sobre estrelas e suas técnicas pois aqui Drummond faz seu uso para imprimir uma força rítmica que dialoga e acentua o conteúdo do próprio poema. Nos versos seguintes o poeta retorna aos versos octossílabos e conclui o poema tão carregado de ironia e negação que fica difícil acreditar que ele não seja mais irônico ou dotado de ritmo.
Todo o poema é uma contradição, forte patente e criativa. O poeta renega a cada verso aquilo que mais substancialmente é: brasileiro e poeta. Ao dizer que não é aquilo que é de fato ele pretende se distanciar de certas posturas que lhe causam aversão entre brasileiros e poetas.
terça-feira, 27 de março de 2012
Tortura Poética
nunca teve de verdade,
Ela cândida e concreta,
qualquer pudor ou vaidade
pra por na linha o poeta
entre os trilhos da cidade
Ela amarrou o poeta
com requinte e crueldade
para sua morte certa
declamaria-lhe Drummond
até encher seus ouvidos
com filosofia barata
causaria-lhe o meio tom
dos versos mais repetidos
de Quintana até Bilac
terça-feira, 13 de março de 2012
Bêbado na Praça da Liberdade
Mas me diga seu Sabino
Porque é que não me responde
Não curte meu desatino
ou porque você é de bronze?