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Poeta e apenas poeta

Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" ...

terça-feira, 7 de junho de 2016

Quarenta e sete minutos

Pro inferno do mais baixo dos círculos
é o ponto exato que eu iria se nisso
eu de fato pudesse crer tranqüilo
sem chance de galhofas ou mil risos

Tranço e destranço as cordas do suicídio
como quem reza as contas de seu terço
que é, até pra ele, macabro e bem ridículo
e cada nó me vale um pé de verso

Pois não vou me orgulhar de ser ateu
você que tem um deus é mais astuto
tem um ser imaginário pra brincar

O que vai me esperar é só um breu
Em um nada tão calmo, absoluto
que da música não posso reclamar

domingo, 5 de junho de 2016

Sinto

"Meus amigos, Amigos, quem serão?"
segurando firme na alça do caixão
cada um vai segurando do seu jeito
conforme dói a culpa do seu peito

"Meus amigos, Amigos, pronde vão?"
bebê-lo tristes pois fomos em vão
cada qual tem nas lágrimas ao leito
seu conforto cruel e contrafeito

Que vai na paz das pás de terra fria
descem, caem, escorrem tantas lágrimas
bem guardadas da chuva e seu clichê

Mas as nuvens são hoje fugidias
com Sol e Rouxinol na mesma lama
e na aba do caixão gruda o chiclete

quinta-feira, 2 de junho de 2016

Fortuna

Tudo que brilha é sagrado
olhe meus olhos brilhantes
Tudo que fez é passado
mil lábios são o bastante?

Nem carinho nem cuidado
são segundos prum instante
Nem vinho nem destilado
calariam esse amante

Por gosto faço-me torto
de toda sorte me livro
troco verso por concreto

Nem sei se quero teu corpo
e menos quero teu crivo
não, não sou o que deu certo

terça-feira, 26 de abril de 2016

Para fins de registro e catalogação

Quero desler nosso livro
derreter até o tipográfico
que imprimiu no nosso sexo
e traficou nosso gozo

Quero rasurar a nota
onde gravei meus segredos
e a ficha catalográfica
hei de sumir nas estantes

Quero que reste só pó
da poesia que matamos
sem rima ou chave de ouro

Ser praga de biblioteca
comer, devorar, tal traça
capa, miolo e contra capa

Fiel

você me deu o que eu nunca
quis ou de você pedi
pelo tempo de hora longa
que não contei ou medi

terça-feira, 12 de abril de 2016

Delivery

se sua morte cobra
Cem reais no moto táxi
pague, tá barato

terça-feira, 5 de abril de 2016

#SaraPintado

com meus olhos tristes
e livreto leve
a poesia segue
entre tantos mestres
que são aprendizes
pra dias mais felizes

segunda-feira, 28 de março de 2016

Cinco ou seis badaladas

Ducha fria de manhã
pode espantar pesadelos?
Até que  me revigora
mas não me faz esquecê-los

segunda-feira, 14 de março de 2016

Pornochanchada para

Lhe digo, não é cilada
ela quer tapa na cara
quer na goela esporrada
É tão pura e doce Lara
quando tá muito inspirada
cheia de sanha e tara

Lhe faço logo a charada
me diga com quanta vara
pica, pau ou caralhada
se satisfaz uma Sara
pois só goza com porrada
que começa e nunca para

Lhe digo, não é errada
quando ela repete, fala
quer muito mais pirocada
que tem muita fome a Clara
na cama nua depilada
geme, grita e escancara

Lhe faço logo a piada
sobre o que será que sara
depois duma chicotada
na bela bunda de Nara
fica roxa, avermelhada
que de quatro se prepara

sexta-feira, 11 de março de 2016

Quanto?

o livreto é livre
contribua se puder
leve se quiser

quinta-feira, 10 de março de 2016

Celerado

Os meus versos desgraçados
não surgem dum elogio
duma alegria em seu cio
mas do choro derramado

Eu que jamais me sacio
tenho um peito carregado
de desejos afogados
nas lágrimas quando rio

Cada verso desalmado
é chuva no meu estio
mamilo que acaricio
num momento emprazerado

Sou errado, vil e vadio
um pedaço mal calculado
perverso desmascarado
que faz dos erros seu fetio

Do mais feio, torto ou errado
ganho um abraço macio
pois deles sou fogo e frio
sou príncipe dos celerados

quarta-feira, 9 de março de 2016

Venenos noturnos

Tem certas coisas
que não terminam
quando se acabam

Tem velharias
que ficam noivas
das agonias

tem os seus fins
no meio do começo
Maltratando os rins

Tem culpa de berço
erva no jardim
E salgado preço

sábado, 5 de março de 2016

Não

Não sei se quero
conversar sério
um tema amargo
tomando trago

Não sei se devo
acordar cedo
depois da insônia
e da vergonha

Não sei se posso
por no pescoço
a mesma corda
que não me acorda

Não sei se dura
minha tortura
no mesmo prego
que bem me esfrego

quarta-feira, 2 de março de 2016

De vestido

Tapa, gemido, escarcéu
lembranças duma conquista.
Serão roxos o troféu
para uma boa masoquista?

terça-feira, 1 de março de 2016

Primeiro de março

Rio de Janeiro em festa
para meu aniversário
na janela pela fresta
vejo apenas o operário
pela chuva castigado
justo nesse feriado

Conserta o que os salafrários
que tão bem tem estragado
com seus régios honorários
e cargos comissionados
fazendo a gente de besta
de segunda até na sexta

Então anoitece sábado
e já não há quem resista
a dançar junto colado
patrão e empregado na pista
sem ver pompa ou salário
domingo é dia de baralho

Feliz idades

bom e sem demora
comi três cus nessas últimas
vinte e quatro horas

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Feliz idades

Sabe como é,
aos primeiro de março
fez de minha vida
Triste cabaré

Atropelamento e fuga

Não me pergunte porquê
Recuse limitações
Venha vamos dar rolê
Nas rodas dos caminhões

Mata ciliar

Descendo lenta em meu rosto
a lágrima veja só
faz dos meus labios um poço

Mentira

Eu queria um soco
na boca do estômago
ao sorriso pouco
de felicidades

Parabéns

Daqui uma semana...
Um dia triste virá
pois a morte engana

domingo, 7 de fevereiro de 2016

Meu caro sanguessuga

O mosquito não me pica
Nem vai embora nem fica
Me agonia seu zumbido
longo fino e atrevido

Por favor caro mosquito, 
Deixa o drama, faniquito
Vai me morde logo aflito
sua saliva, meu agito

Deixa meu sangue escorrer
Por sua boca,sua picada
Deixa o sangue esvair
deixa meu gosto partir

Se farta na minha carne
Mas me deixa sem zumbido
Deixa pra vir quando
já estiver dormido

Com minhas veias vermelhas
bem abertas e pulsando
Para meu doce mosquito
que banqueteia pousando

A me morder, a me sugar. 
com finíssima navalha 
feita de caco de vidro
Na umidade do colchão

De lençol branco e marrom
salpicado de vermelho
Vem seu mosquito zumbindo
fazer canção de ninar

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Sabor semelhante

Ducha molhando meu rosto
E a água que cai nos meus lábios
Não é salobra de mar
Mas dum copioso chorar

O que não vejo

Nem tardo nem cedo
seu falso querer
eu tenho meu medo
medo de você

Seu falso enredo
de me dizer
que lhe trago azedo
no fel de você

desço sem mais lágrimas
e sem mais soluço
do fim ao princípio

entre minhas lástimas
sequer um impulso
para meu precipício

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Dos delírios e deleites

Ele todo dia regava
os seios da moça amada
com seu sêmen e saliva
ansioso por sua florada
de lírios e copos de leite

Das coisas

mais fora de hora e de lugar:
-Carne de soja em churrasco
-Retiro espiritual
na sexta de carnaval

Hedonismo

A cama é king
e a preguiça Kong
pra fazer swingue
e fumar um bong

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Incêndio

Enquanto na floresta se buscava
co'as bocas, bicos, trombas e suas patas
um tanto qualquer d'água para essas matas
que nas chamas do incêndio já queimava

O lobo, sentado, seu vento tragava
usando de suas forças mais inatas
a procurar aquelas almas rotas
que tudo novamente incendiava

As feras atarantadas julgavam:
ele parado, sem nada ajudar!

"Que ser mais egoísta!" - murmuravam
não o viram sorrateiro a circundar...

Pois quando as brasas altas crepitavam
com fome de homens se pôs a caçar.

Quadras calculadas

sílaba poética
é saber que verso
não é aritmética
mas da prosa o perverso
*
prum ouvido certo
versificação
é medida de metro
sem regulação
*
dentro duma métrica
cabe o não pensado
duma frase cética
num texto sagrado
*
o poeta escande
como alguém que canta
e não como quem conta
moedas e as esconde

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

à luz da Lamparina

Meu pai criava em sua mente todas as formas, luzes, gestos, olhares e sombras das assombrações que meu avô lhe narrava à luz da lamparina, os filhos da minha geração recebem todos os mínimos detalhes de seus monstros narrados através das telas de seus tablets. Não há mais qualquer espaço para que o espectador do tablet crie em sua mente as feições que recebe das luzes do tablet.  Cada monstro, cada personagem já tem impressa sua cor, forma e tamanho de maneira indissociável, sem qualquer espaço ou possibilidade de liberdade para o espectador.

O narrador da lamparina, o livro de contos e histórias fantásticas, os romances, as epopeias, e as notícias do jornal impresso cada vez mais são substituídas por narrativas apinhadas de sons e imagens que provam e comprovam sua forma como indissolúvel, pronta e acabada. Quadro a quadro em movimento, narrado e articulado sem deixar espaço para que o receptor inclua ali sua perspectiva, sua ótica. Cada mensagem acompanhada de todo um aparato imagético comprova sua veracidade indiscutível, é pois as imagens não mentem.

Num mundo imagético, onde tudo é movimento, fala, som e imagem. Num mundo onde toda informação é dada como pronta, acabada. O ato da Literatura, per si, sem outro suporte que não a escrita é um ato político. A poesia escrita e lida é avisa rara na contemporaneidade. É uma arte incompleta em sua produção pois depende sempre do leitor para ter seu som e imagem concebidos.
No momento em que o leitor  inicia a leitura  é o exato momento que ele se implica no texto pois e forçado a preencher as lacunas do que lê consigo mesmo, com suas experiências, com suas memórias, tendo como argamassa sua imaginação fresca e, pro vezes, nunca antes utilizada. E nesse despertar da imaginação nasce a capacidade de criar novas narrativas para o que já recebe de antemão como dado.
Um livreto de poesia dentro dos vagões do metrô caem, por vezes, no colo desse espectador televisivo, de seu filho empolgado pelo novo jogo em seu tablet. E aquela leitura de poucas páginas, de amor, de piada, de política e até metalinguagem pode despertar o gosto, o desejo por atiçar a parte imaginativa tão esquecida, tão oculta e guardada num quotidiano que não dá mais espaço para seu exercício.
Uma mente capaz de imaginar os olhos, boca e nariz da amada do poeta também é capaz de usar dessa mesma imaginação para descortinar as sombras veladas que os flashes das câmeras não alcançam. Cada dobra de página, cada personagem que é construído gera a dúvida salutar de que se Capitu traiu ou não Bentinho. Se a narrativa do jornal das 10 condiz ou não com a verdade, se a perspectiva é mesmo a única possível, se outras imagens não existem e contradizem aquela posta ao ar em rede nacional. Um poema de amor, num mundo onde a própria imaginação não tem mais vez, é um ato político. Um ato político de despertar pois " a poesia torna possível o que já se tornou impossível na prosa da realidade.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Cidade digital

Computador lento
é um engarrafamento
de bits ou de bytes?

domingo, 27 de dezembro de 2015

É como se diz:

Com palmas e bis
doce Beatriz
ficou por um triz
de ser meretriz

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Tropa Natalina

Começou como tropeiro
pelo sertão derradeiro
das muitas minas gerais,
bem longe das capitais
guiando burros em tropa
e com cavalo que trota!
 
Mula madrinha enfeitada
por muito chão, muita estrada
levava o comércio de ouro
dentro do embornal de couro
dos garimpos até os roçados
era ele muito aguardado

Trocou tropa pelo trem
e ao progresso disse amem
quando a ferrovia chegou
e novamente se inventou
pois dentro do seu vagão
todo, arroz, milho, feijão

Ele mesmo compraria
para vender lá na Bahia
e de lá vinha descendo
com o seu vagão trazendo
perfumes, panos, tecidos,
remédios e mil artigos

Por anos indo e vindo
fez ele seus dividendos
Casado com Terezinha
fizeram na vilazinha
seu comércio e pensão,
a maior da região.

Com a casa logo erguida
já quiseram em seguida
uma professora pra lá
para contas e beabá
ensinar pela primeira
vez para essa vila inteira

Nem tudo foi belo e bom
e num grito fora do tom
vieram os tiros de canhão
e trem, vagão e estação
já não existiam tais
e mudou-se uma vez mais

De Alfredo Graça pegaram
o último trem e pararam
na cidade de Teofilo Otoni
e eles sofreram ali
a triste separação
em nome da educação

De todos os seus filhos
Natalino foi nos trilhos
de volta para a fazenda
de seus pais numa contenda
lá para as margens do Rio
Setúbal num desafio

Feira Natalina

Quando sábado chegava
Seu Natalino montava
o seu cavalo Rosi
que já sabia pra onde ir:
de Santa Cruz, sua fazenda
até a feira buscar a renda.
 
Na vila do Jenipapo
era a feira de trapo,
rapadura, porco, pinga,
panela, couve, moringa,
linguiça, milho, feijão,
gado, queijo e requeijão....
 
Natalino bom mascate
na feira dava arremate
nas pagas e encomendas
que faziam pra sua moenda
de rapadura e cachaça
enquanto andava na praça.

Anotava, em prosa lenta,
num papel de letra atenta
uma nova e boa encomenda
Parava e resolvia a contenda
dum filho querendo comer
queijo e groselha beber

 De passada lenta e aberta
andava como quem acerta
na sorte fazendo o que gosta
vivendo e vendendo a roça
que cuidava com carinho
tal pássaro do seu ninho

Essa vila orgulho lhe dava
quem dissesse não errava
do mercado até a Igreja
tinha da sua bemfazeja
cada rua cada calçada
fez com esmero de morada

 Mas não fez sozinho é certo
tinha amigos bem diletos
com quem andava e proseava
e até versos declamava
histórias de assombração
e também de lampião
 
De boa prosa e jeito calmo
foi delegado da região
de Araçuai, Jenipapo,
de Machados, Badaró,
até Córrego das Velhas,
Berilo e também Chapada
 
Era um delegado diferente
desses tipos boa gente
não mandava prender
se dava pra resolver
com conversa, com conselho
via no outro sempre um espelho

Seus olhos azuis sérios
de contador de mistérios
de troças, de escalabros
de piadas e de causos
um mundo se emocionavam
quando seus filhos chegavam

Pois estudavam bem longe
Araçuai, Teofilo Otoni
e também Belo Horizonte
mas nas férias iam pra feira
nos burros e na traseira
do seu cavalo Rosi




quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Flâmula

Em seu talo eu me embalo
sua menina meretriz
e se diz: ‘‘ fela me o falo’’
seu falo felo feliz

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Lama

De vida, de morte
de jornada breve
Com acaso, sorte
e meu peso leve

De fome, banquete
natural, urbano,
selva,  palacete,
animal e humano

Sou chama sou brisa
pra tudo que me
refresca e atiça

Sou terra sou água
pra tudo que me
soterra e deságua

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Sou terra
pra tudo
que me
soterra

Sou água
pra tudo
que me
deságua

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Ela

Nos enredos já se atira
nos medos sequer respira
pois me inspira seus segredos
quando pira em meus dedos

sábado, 28 de novembro de 2015

Carnavalescer

Pois se nós, reles mortais
ainda estamos em janeiro,
dezembro, junho ou mais
tristes por um ano inteiro
entre seus risos e ais

Ele bem tá em fevereiro
e vive seus carnavais
roda de samba e pandeiro
cariocando muito mais
que eu ou outro brasileiro

Pois se nós, reles mortais
vamos depois dum dia inteiro
contentes pros triviais
botecos de bom mineiro
dessas e doutras gerais

Ele, samba derradeiro
em tão doces festivais
pois no Rio de Janeiro
se carnavalece mais
de março até fevereiro

puxando papo
pedindo ixqueiro
numa ixquina
fazendo ixcola
ficando em paix

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Lágrima

Ela, estátua de mármore, era bela, belíssima e também muito emotiva. Mas sempre parecia impassível, insensível por segurar suas lágrimas. E, de fato, Ela fazia de tudo para contê-las, como um dique de castor, pois suas lágrimas eram tão ácidas que quando escorriam pelo seu rosto marcava-lhe em sulcos como o leito de um rio caudaloso passando pelas bochechas e desaguando no lago de seus lábios.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Seu rabo

Que belo!
Eu quero
fodê-lo
com esmero.

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Questão

Qual animal
late mil vezes?
- O gato
ele faz mil-au

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Before Honeymoon

It's very good
I'ts very fun
We have a new mood
to eat bubble gum

It's very good
I'ts very fun
He is my favorite food
and my sauce is his cum

In the last afternoon
with kisses and bites
me and my husband

play hard in bedrom
and it sounds like
the best house band

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Oitava do Regojizo

Gorgogeando galante
a grande glande de Glad
se degladia co'a garganta
gulosa da gorda Glória
se golfando nos galopes
da grande glande de Glad
que ginga gostosamente
e goza grosso e gostoso

domingo, 11 de outubro de 2015

Oitava do Verso da Moeda

Antes pedido nas bolsas
de tão sorridentes moças
Antes esquecido nos bolsos
de tão sonhadores moços
O metal, enfileirado,
bem contado e recontado
Guarda verdade secreta:
pois paga o pão do poeta.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Coronel

Coronel, nove décadas,  aposentado.
Guarda com muito orgulho sua farda do lado
da cama, paga com soldo, mas sem o saldo
de sangue, do vil golpe de sessenta e quatro.

Mineiro, nasceu negro, no ano vinte e cinco
do século passado, soube que era odiado:
pela pele, tamanho e pela cara dura
de defender o voto colocado na urna!

Vê com desgosto, quase que com um desdém,
o jovem cabo, malfa(r)dado que enganado
de joelhos, ao golpe, reza seu amem...

Mal sabe ele que é só dormente para o trem
de empresários e generais endinheirados
e seu soldo... é pouco, amargo e não cai bem.

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Modernice

Seus pequenos pensamentos
Levemente filosóficos
Por si só  já não fazem
Um belo ou denso poema

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Lentes 2

Eu, Branco prum Brasileiro
e Preto prum Europeu
Ascendo socialmente
com um par de verdes lentes

Lentes

Nem todos me entendem...
Quem é que diria!
que olhos verdes vendem
bem mais poesia.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Lusófono

Porque falar zine
E não livreto?
Porque usar o inglês
como um cabresto?

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

ao ponto

saliva é tempero
quero sua língua de brasa
grelhando meu grelo

terça-feira, 8 de setembro de 2015

à moda de duchamp

Atenção Atenção!
Isso não é um poema

domingo, 6 de setembro de 2015

Libertino

Eu me velo e desvelo num santo martírio
pelo que quero muito tanto ou talvez
Eu me faço e desfaço num doce delírio
pelo que trago, bebo e tomo duma vez

Eu que me corto, sangro mas também lhe firo
numa inocência pura vista nos bebês
mostro os dentes caninos dum velho vampiro
lhe rompendo pudores por toda sua tez

muito prazer sou seu satânico desejo
seu sexo mais ardente que todos pecados
de Sodoma, Gomorra e terras além-mar

Não me tema nem trema diante do meu beijo
sou fome, sou paixão de peito perfumado
pois em sua pouca carne vim para ficar

sábado, 5 de setembro de 2015

Ruazinha

Teima o sol avermelhado
a se por no fim da tarde
Quer ver os guri endiabrado
brincando com bola que arde

Quer ver o homem tão cansado
quando seu Fiat Uno invade
O campinho demarcado
com chinelos e com alarde

Gritam logo "Contra Mão"
A rua é arena da Bola
e o carro maior vilão

O homem desce desenrola
"Tem como passá aqui não"
"Eta vida! Vou embora..."

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Composição

musa e autor dormem
e um poema na gaveta
perde a poesia

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Dos moinhos de vento

Eu acho tão engraçado quando poetas contemporâneos exaltam que seus versos não tem métrica ou rima.

Falam de um jeito como se isso fosse uma particularidade, um feito, algo que distinguisse sua poética das demais que o cercam, como se fosse algo muito diferente do que é feito hoje.

Mal percebem que o verso livre já virou arroz de festa, completamente hegemônico e dentro do manual da boa poesia contemporânea.

Meu caro poeta contemporâneo, você pode fazer seus versos livres à vontade, mas, por favor, não acredito que isso seja um feito revolucionário ou digno de ser exaltado.

Essa revolução já aconteceu no início do século passado e o monstro parnasiano que diz hoje combater tem tanto poder quanto os gigantes de Dom Quixote.

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Sou o que sou

Eu não viveria no céu;
Gosto do cheiro da terra,
do suor de gente que erra,
acerta e faz escarceu.

Eu não viveria no céu;
Gosto do cheiro de vida
de cutucar a ferida.
Bolero lambada e créu!

Eu sou do tipo atrevido,
que nunca tá resolvido;
como sujeito normal.

Eu sou o que sou e posso
no que faço, vou e aposto
botando pimenta e sal

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Boca Suja

Diz Maria Clara irritada:
"Pu/ta/ que/ pa/riu/ xe/reca
ti/nha/ á/gua/ ne/ssa/ merda"
Pois é,  xingando com métrica

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Recontagem

A volta do voto impresso
um baita dum retrocesso!
Quem for ficar de malgrado
Chama o melhor advogado...

sábado, 25 de julho de 2015

Dândi

Ajusto logo esse foco
de lente, cabelo curto
Auto-retrato in loco
serei sucesso absurdo

quinta-feira, 23 de julho de 2015

Lingüistica

Porque é que pé
rima com Chulé?
(Se fosse  fedor
seria um terror!)

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Estrela

Esse país cada dia
me da mais orgulho
Estamos pouco a pouco
Limpado todo o entulho
Deixados pelos ridículos
E sanguinários milícos.

Cada dia muito menos
gente passa fome
E mais gente pode ter
O seu sonhado iphone
E temos faculdades instaladas
nas cidades mais afastadas

Pouco em 12 anos
mas muito mais do que em 38
O Brasil volta a crescer
depois de 50 anos parado.
38 estragando e 12 consertando
o malfeito de tanto deputado.

Há uma estrela de esperança
Vermelha como o coração
Se você desistiu de nossas crianças
Eu ainda não.

Haiquase

Imagine esse mundo
que panfletasse poemas 
no lugar de compro ouro...

sábado, 4 de julho de 2015

Pragmática

Sim, eu sou de esquerda
pois o problema da fome
é muito mais importante
que o preço do seu iphone

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Moça do vestido azul

Quero dedilhar meus dedos
quero-os em ti mergulhados
Nadando dum lado ao outro
em suas carnes envoltos

E sentir-me abocanhado
pouco a pouco cravado
pelos seus labios revoltos
provando-me mil gostos

De falo rijo te faço
esse poema devasso
tal uma canção perversa

Pois me inspira quando pira
quando arfa, goza, delira,
devora (ou vice e versa)

terça-feira, 23 de junho de 2015

Inflação

Poeta num mal-me-quer
reclama da seda mais cara.
Porém, se a Musa lhe der,
um tapa, sequer repara...

sexta-feira, 12 de junho de 2015

terça-feira, 5 de maio de 2015

Eu, homem

Melhor ter remorso
que arrependimentos
Ou seguir pro inferno
que os dez mandamentos

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Sordidez Carioca

Na escadaria da Lapa
entre um Baseado e outro
eles planejam a Revolução

Entre um e outro tapa
o Nego da Rocinha
tem medo do B.O. de
Desacato, Conflito e Resistência

E com muito pó na cabeça
numa cobertura no Leblon
Ele planeja com cuidado
como deixar as coisas como estão

Redondilha maior ou menor?

"Cinco sílabas poéticas"
Formam um verso de sete
sílabas poéticas contadas
Até a última das tônicas

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Pecado

Vem o capeta e atiça
uma Rede na varanda
Para dizer que quem manda
nessa porra é a preguiça

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Com quantas becas se faz um poema?

Leve você em qualquer laje
versos sem assinatura
dum nome de d'douro traje
que apenas será loucura

Bote num museu de mármore
um penico na moldura
que cada macaco na árvore
em coro dirá:" arte pura"

Vai tenta arrisca petisca
de banquete a quem tem gula
faz sua arte visceral

Tome cuidado caro artista
que arte não cai bem com bula
e nem vem com manual

sexta-feira, 27 de março de 2015

Podorastia di versos

bem no pé do verso
sibila uma língua
que lânguida lambe
o metro e sua tônica

Em saliva imerso
o lábio à míngua
deixa que se game
na orgia polifônica

segunda-feira, 16 de março de 2015

Bom mocinho

Baixinha de peitos grandes
dona dum bumbum durinho
Rebola assim aos galopes
que engole meu pau todinho

Me chupa do talo à glande
com fome e com carinho
Num tesão rude que range
quando lhe dedo o rabinho

Pulsa e repulsa meu sangue
deixando meu pau durinho
Minha saliva vai longe
melando seu anelzinho

São meus dedos que lhe expande
aos poucos seu buraquinho
Até que se torne grande
pra que eu entre de mansinho

Seu doce gemido me unge
no papel de malvadinho
Que com vigor lhe inflige
um gozo pelo cuzinho

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Filosofices

Não sou Pedro
Não sou pedra
A minha lavra
De mil palavras
É de  poesia

Na minha igreja
Não tem pecado
Não tem culpa
E muito menos
A tal sacristia

Não sou senhor
Não sou escravo
Todos dias travo
Um doce trago
De melancolia

No meu terreiro
Na minha terra
Certo é quem erra
Quem de tão torto
Acerta a alegria

Capitão do mato século XXI

Um negro vestindo preto
faz papel de autoridade
à mando dum branco que
traja terno e faculdade

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

SE ESSA RUA FOSSE MINHA

(versão verão)
Se essa rua
Se essa rua fosse minha
Eu mandava
Eu mandava já plantar
Muita árvore
Muita árvore sombreante
Para o meu
Para o meu calor passar
Nessa rua
Nessa rua tá tão quente
Que se frita
Que se frita ovo no chão
Dentro dela
Dentro dela mora um sol
Que roubou
Que roubou meu tesão
Se eu roubei
Se eu roubei teu tesão
Tu roubaste
Tu roubaste o meu também
Se eu roubei
Se eu roubei teu tesão
É porque
É porque te quero sem

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Madame Baderna

Me despetala em trapos, fitas, pétalas
de bem e mal me quer que mais me quer
que desdenha, destrata, mas me quer
como porta-bandeiras e abre-alas

Pois Eu me apego e até pago pra ver
dentro do porta-luvas levo as mágoas
e encho com alegria o porta-malas
sou da escola do samba e bem querer

Eu, Madame Baderna com prazer
tomo da tina e latrina de restos
essas babas e beijos dos amores

Eu sou essa Arlequina com as cores
que não se cabem nos pincéis modestos
desses caras sem cara pra bater

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

NO FIM DO CORREDOR

No fim do corredor tinha um banheiro
tinha um banheiro no fim do corredor
tinha um banheiro
no fim do corredor tinha um banheiro.

Nunca me esquecerei desse momento
na vida de minhas calças tão respingadas
Nunca me esquecerei que no fim do corredor
tinha um banheiro
tinha um banheiro no fim do corredor
no fim do corredor tinha um banheiro.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

mau conselho

abuse dos lábios
que quase dá pra deixar
a língua de lado

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Trágico

Eu vivo desde sempre
um paradoxo míope
de precisar dos óculos
para achar os meus óculos

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Dieta

Batata Vegana?
Bah! A batata da boa
É frita na banha!

Salada Etílico-Poética

Bilac Bêbado, Bilac Bêbado
não seu Olavo, num é chacota não
é verso sáfico de metro dado
aos meus poetas sem rima e solução

Eu conto sílabas num dedo a dedo
nesta veloz prestidigitação
que engana versos bem mal remendados
sendo meu velho truque de salão

Dez sílabas safadas que dos Anjos,
com maestria de quem Espanca sem
nos causar marcas, causou mais que medo

Dez sílabas heroicas são arranjos
pra Cisne Negro e Passarinho dizerem
a pior das verdades e um segredo.

Vernelho

Me enche de tesão
quando o seu batom
vem manchando o talo
do meu rijo falo

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Depois do Brinde

Havia uma sede de saliva
havia uma fome atrevida
De lhe fazer mais cativa
em vontade bem vivida

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Desgosto do Cavalo Branco

Eu que desgosto do cavalo branco
e nunca fui o primeiro da turma,
faço-me feio, torto e até manco:
sou mau agouro d'alma mais soturna...

Eu que carrego meu talento franco
de vaguear numa insônia noturna,
recuso-me a seguir por mais um tanto
de tédio e labor da vida curta!

Eu jamais seguirei num galopante
corcel alado tal conto de fadas.

Eu que sempre serei fidel amante
das moças e mulheres mais erradas...

Eu, nem príncipe nem bobo ou infante,
sou poeta de rimas espalhadas!

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Estóico

A
moderação, 
em excesso,
faz mal?

Questão de ritmo

Paralelepípedo
é uma redondilha
mesmo com suas quinas
tamanho família

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Pragmática

É a praga da matemática
que insiste em dizer que dois
e dois só é e só pode ser
o rigoroso de um quatro

Sendo que nós precisamos
pra fazer o bem de todos
e da nação que então seja
ao menos cinco ou seis 

O conservador tortura
e conserva a dor de um três
querendo menos que dois

E o radical queima o palanque,
rasga a tabela exigindo
nada menos que seu dez

sexta-feira, 6 de junho de 2014

ÁGUA VIVA: O JARDIM METAFÍSICO

O JARDIM

O Jardim aparece como alegoria a multiplicidade do universo segundo a metafísica de Clarice Linspector em Água Viva. É um elemento cuja a metáfora abarca em si todo o universo da Natureza Espinosiana, "Deus ou seja Natureza" é uma expressão que define bem a concepção de Clarrice em seu panteismo feito em prosa poética dotado de uma polissemia própria e pungente.

Em uma  honesta tentativa de decifrar Clarice Linspector e seu feérico livro Água Viva para uma árida metafísica resolvi por bem não abrir mão do lirismo absurdamente indissociável dessa obra e fazer uma análise mito-poética de sua especificidade universalizante.

"Neste  instante-já  estou  envolvida  por  um  vagueante  desejo difuso de maravilhamento e milhares de reflexos do sol na água que  corre  da  bica  na  relva  de  um  jardim  todo  maduro  de  perfumes,  jardim  e  sombras  que  invento  já  e  agora  e  que  são  o meio  concreto  de  falar  neste  meu  instante  de  vida.  Meu  estado  é  o  de  jardim  com   água  correndo.  Descrevendo - o  tento  misturar  palavras  para  que  o  tempo  se  faça.  O  que  te  digo  deve   ser lido rapidamente como quando se olha."

Jardim é o instante-já onde a Natureza se revela ao leitor em toda a sua compreensão possível de mundo é a forma inteligível que o conhecer humano concebe para ascender ao divino e ao transcendental. Vale dizer que por seu caráter mito poético O Jardim não é mera metáfora do universo em sua totalidade é ele de fato in natura. O olhar rápido e a imediaticidade revelam o primeiro e mais direto contato com a  Verdade que o Jardim representa, a natureza é tautológica per si é “Uma rosa é uma rosa é uma rosa”.

O verso de Gertrude Stein seduz ao um entendimento imediato que apenas a Natureza quando vista pelos olhos poéticos consegue traduzir-se, traduzir-se não. Apreender, pois é um processo que não se prende aos intelectualismos semânticos e sim um processo que se dá por transcendência do conceito em ato de si.

“Sei  da  história  de  uma  rosa.  Parece -te  estranho  falar  em rosa quando  estou me ocupando com bichos? Mas ela agiu de um modo tal que lembra os mistérios animais. De dois em dois dias eu comprava  uma  rosa  e  colocava-a  na  água  dentro  da  jarra  feita especialmente para abrigar o longo talo de uma só  flor. De dois em dois dias a rosa murchava e eu a trocava por outra. Até que houve  determinada  rosa.  Cor-de-rosa  sem  corante  ou  enxerto porém  do  mais  vivo  rosa  pela  natureza  mesmo.  Sua  beleza alargava o coração em amplidões.”

Rosa, a máxima flor,  presentifica-se em meio ao natural reino dos bichos, os próprios reinos são criação do humano em sua tentativa vã de classificar, nomear e dar significado à poética do Jardim.  O cor-de-rosa é uma perfeita representação do estado aparentemente indistinto do real pela ótica humana, mas pela Natureza é representação máxima de um estado que é vivo e verdadeiro. Mesmo que não alcançado pela dialética de olho e mente de quem observa a Rosa.

A prisão da rosa no cárcere doméstico é uma alegoria forte da linguagem que tenta a todo custo dar conta do real sacrificando-o, murchando-o em prol de sua domabilidade, de sua domesticação ao espaço da mente humana. Nomear o Ser é restringí-lo à uma pálida expressão de si mesmo.  A linguagem humana aponta, sugere, faz-se uma sombra sob a Verdade e não a compreede, assim é esperar que a água do jarro nutra eternamente a Rosa que ornamenta a mesa da sala de jantar.

"Para me refazer e  te  refazer  volto a meu estado de jardim e  sombra,  fresca  realidade,  mal  existo  e  se  existo  é  com  delicado cuidado.  Em  redor  da  sombra  faz  calor  de  suor  abundante. Estou  viva.  Mas  sinto  que  ainda  não  alcancei  os  meus  limites, fronteiras  com  o  quê?  sem  fronteiras,  a  aventura  da  liberdade perigosa.  Mas  arrisco,  vivo  arriscando.  Estou  cheia  de  acácias balançando  amarelas,  e  eu  que  mal  e  mal  comecei  a  minha jornada,  começo-a  com  um  senso  de  tragédia,  adivinhando  para que oceano perdido vão os meus  passos de vida."

A compreensão de si que se insere no contemplamento do Jardim é de uma total indentificação entre o eu e o mundo. Uma indissocialidade tântrica que permeia o pensamento Clariceano de tal forma que não há espaço para a metáfora morta o que há é uma absoluta multiplicidade que dissolve o Eu entre as acácias amarelas, entre o espírito da liberdade e as raizes da realidade.

O Suor, elemento tragicamente humano, contrasta como resíduo indesejável da tentaiva humana de lançar luzes sobre a Verdade. A realidade em seu frescor está nos limites fronteiriços das possibilidades do entendimento racional e apenas a poética é capaz de tomar para si um vislumbre momentâneo dessa totalidade panteística.

"Agora vou falar da dolência das flores para sentir mais o que  existe.  Antes  te  dou  com  prazer  o  néctar,  suco  doce  que muitas flores contém e que os insetos buscam com avidez. Pistilo é órgão  feminino  da  flor  que  geralmente  ocupa  o  centro  e  contém  o rudimento  da  semente.  Pólen  é  pó  fecundante  produzido  nos estames  e  contido  nas  anteras.  Estame  é  o  órgão  masculino  da flor.  É  composto  por  estilete  e  pela  antera  na  parte  inferior contornando o  pistilo. Fecundação é a união de dois elementos de  geração  -  masculino  e  feminino  -   da  qual  resulta  o  fruto fértil.  "E  plantou  Javé  Deus  um  jardim  no  Éden  que  fica  no  Oriente e colocou nele o homem que formara" (Gen. 11, 8)."

Em Água Viva Lispector  partilha com Espinoza de um panteismo cristão que torna  Natureza o divino, indissocia e funde num universalismo, aqui simbolizado pelo Jardim, todo o Amor que há enquanto Verdade. E é nessa fusão que se encontra a narrativa de Clarice que sendo uma narradora também é personagem e narrada de sua própria obra. O eu-lirico dessa prosa profundamente poética imiscui-se do Divino para ter em si o initeligível que é próprio da existência que é mesmo quando não dita ou não significada.

A dolência das flores, elemento-símbolo do jardim. contrasta a primeira vista com o Desejo de um Criador e numa descrição absolutamente profana da Flor enquanto sexo e geradora de vida. Clarice inverte a concepção de Criador unindo no Éden todo o humano presentificado no néctar da Natureza. O suco doce das Flores é buscado com avidez pelo inseto mas também pelo próprio homem que sendo parte da Natureza tenta negar que é uno ao Todo nesse Jardim.

"Mas conheço também outra vida ainda. Conheço e quero-a e devoro-a  truculentamente.  É  uma  vida  de  violência  mágica.  É misteriosa  e  enfeitiçante.  Nela  as  cobras  se  enlaçam  enquanto  as estrelas  tremem.  Gotas  de  água  pingam  na  obscuridade fosforescente da gruta. Nesse escuro as flores se entrelaçam  em jardim  feérico  e  úmido."

A gruta  com suas sombras é uma caverna onde o homem contemplas as suas sombras sob a pálida luz fosforescente. É um indicativo do espaço humano dentro desse universo polissemântico, de apenas perceber as sombras, o obscuro.  Um leve contorno daquilo que é de fato.

A avidez descrita por Lispector é parte da ânsia humana que se desvela num mundo onde o homem não participa mais. O Jardim Feérico vai para além da compreensão humana pois é o espaço onde cobras  dialogam com as estrelas, onde a virulência da realidade não tenta impor seu domínio por completo, onde a Vida e a Verdade coexistem em plena harmonia sem mediações artificiais e onde o mistério é aceito como tal.

" No  Jardim  Botânico, então,  fico  exaurida.  Tenho  que  tomar  conta  com  o  olhar  de milhares  de  plantas  e  árvores  e  sobretudo da vitória-régia.  Ela está lá. E eu a olho."

        A contemplação da vitória-régia é uma sintese perfeita da postura da autora frente ao Real. Um simples Ser-em-si. O olhar precedido da existência e nada mais. O Real enquanto presentificação do Ser garante ao olhar do Jardim um êxtase místico. Uma verdadeira existência que esgota o ser humano, a contemplação do Real, exaure o indivíduo pois o mesmo não é capaz de abarcar toda sua infinitude. E a contemplação per si deve bastar pois a linguagem não pode mais do que sugerí-lo Indicar a Natureza é máximo que a mente finita do homem pode fazer em sua comunicabilidade desprovida da universalidade contida no Ser.

        A recorrência do Jardim na prosa de Clarice denota o eterno desejo humano de domesticar a Natureza, de tê-la sob sua capacidade intelectiva e de vontade. Seja por preces ou tubos de ensaio é o homem com sua linguagem tentando cada vez mais dar conta dessa infinitude que o ultrapassa mas que mesmo assim o fascina. A poética de Clarice é uma ode ao humano que conta grãos de areia imaginando-se colecionador de estrelas. 

terça-feira, 3 de junho de 2014

Saudades?

A falta que ainda me faz
é a mesmíssima dum par
de pesos presos aos pés
quando me ponho a nadar

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Alcorão 2.0

Não há nenhum deus se não o Google
e o Wikipédia é seu profeta.

domingo, 30 de março de 2014

sexta-feira, 14 de março de 2014

Dizer que:

todo político é corrupto, 
todo político é ladrão. 
É o melhor salvo conduto
pra manter as coisas como estão.

Deixando todos enlameados
os que tem culpa e os que não
favorece os mais emporcalhados
que de sujeira entendem de montão.

O coronel engravatado
reina na sujeira do sertão

O midiático cooptado
domina fácil a televisão

E todo mundo é enganado
por esse velho chavão

quarta-feira, 12 de março de 2014

Pois os conta-sílabas ainda não estão extintos.

Segunda feira é dia de reunião na casinha. Reunião de poetas na casa do Catete para discutirmos as ações de nosso grupo poético que estava até sem nome  após o fim do contrato com o SESC. Passamos horas e horas pensando e debatendo um nome que substituiria o Fora de Área, passamos por Balalaica, Balacrente, Clubinho Poético, Pedra Portuguesa, Foda Diária e outros tantos até chegarmos ao nome Vide Verso onde toda sua polissemia nos encantou.

Escolhido o nome pensamos na identidade visual e nas futuras ações poéticas que executaríamos ao longo do ano a volta das oficinas, as interferências e as apresentações... A reunião se estendeu para depois das dez da noite e quando peguei o vagão do metrô já estava mais vazio. Só para não perder o costume  saquei meus livretos de dentro da bolsa.

Distribui por todo vagão com um sorriso no rosto mas poucas pegavam e na volta menos ainda pagaram pelo prazer de ler poesia. Mas no fim do vagão uma senhora me chamou a atenção, ela estava compenetrada em meus versos e seus dedos se mexiam freneticamente contando as sílabas dos meus versos!

Encontrar outra conta-sílabas é cada vez mais raro com essa ditadura do verso livre. Foi um enorme prazer sentar ao lado dela e partilhar desse prazer que é a escansão, vê-la contando à moda espanhola que conta todas as sílabas do verso e me justificar dizendo que sigo a moda francesa de se contar somente até a última tônica.Acertado os termos ela conferiu que todos os versos estavam mesmo em redondilha maior. Era um sonetilho que agora tinha sido contado e revisado dentro do vagão. É bom encontrar com quem eu posso conversar na mesma língua.

E pensar que semanas antes uma revisora de oportunidade veio me corrigir a gramática sacrificando o ritmo e a oralidade de outro poema... O verso "lhe tomo num trago"  tem um ritmo e uma melodia que "tomo-lhe em um trago" perde totalmente! Foi triste ser corrigido assim por alguém letrado, que faz da revisão o seu ganha pão, mas que ignora os conceitos mais básicos do que é poesia.

Por essas e por outras que eu elegi os vagões do metrô e seus personagens como meu melhor público no lugar daqueles acadêmicos com seus artigos e teses modernas debaixo do braço.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Poema Botequeiro

Nos bares do Brasil a cada 100 recados de guardanapo
57 são amassados antes de serem lidos

Nos bares do Brasil
a cada 100 recados de guardanapo
57 são amassados antes de serem lidos

Nos bares do Brasil
a cada 100 recados
de guardanapo
57 são amassados
antes
de serem lidos

antes de serem lidos
antes de serem lidos
antes de serem lidos
antes de serem lidos

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Redondilha Maior

Sou o que sou, por inteiro
e acredito que me expresso
dum jeito mais verdadeiro
se pelo verso me meço

Sou do tipo poeteiro
que mesmo quando converso
vou escandindo o letreiro
poético que estou imerso

São minhas métricas escravas
as cartas dum palacete

São palavras pouco sábias
que poeto pra cacete

São minhas sete sílabas
o mais redondo banquete

sábado, 11 de janeiro de 2014

A Menina Mariposa

A Menina Mariposa
só vê num verso qualquer
um espelho que desposa
sua vaidade de mulher

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Menina-raposa

Menina-raposa
seu corpo de flor
espinho e rosa
em perfume e cor

Menina-raposa
lhe sorvo o suor
de garoa nova
em tom sonhador

Menina-raposa
lhe provo o sabor
que tanto nos goza
em prazer e dor

Menina-raposa
sou seu caçador
de verso e de prosa
pecado e pudor